segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

BARALHA E TORNA A DAR

                                                            (Voz de Galicia)
 

(Não tinha grandes esperanças que as eleições na Catalunha desatassem o enorme lio suicidário em que a Espanha e a região estão mergulhados. Mas mesmo na incerteza os atos eleitorais trazem informação. Em plena pandemia, duas alternativas continuam em cima da mesa: negociação política para suster e diferir o inevitável ou o caos regenerador sabe-se lá com que consequências.)


         As eleições de ontem, que segui numa ruidosa (pelo aceso debate) TVE 24 horas (e não me digam que a televisão espanhola não é bem mais plural que a nacionalista TV3 catalã) trazem quatro conclusões principais:

  • O Partido Socialista Catalão ganha as eleições em votos e em deputados, retomando uma presença que o atamancado Zapatero tinha começado a corroer com as suas invenções fantasiosas sobre o estatuto de autonomia;
  • O independentismo catalão (Esquerra Republicana, Junts per Catalunya e a mais radical CUP) reforça posições, sendo minoritário apenas na região de Barcelona;
  • O partido de Ada Colau aguenta com 8 deputados;
  • A direita do PP e CIUDADANOS colapsa sendo ultrapassada pelo nacionalismo extremo do VOX que tem mais deputados do que o PP e CIUDADANOS juntos e que saudades da rebeldia da azougada Ines Arrimadas, perdida nas malhas de um partido por consolidar.

O problema é que em matéria de governabilidade da autonomia baralhou-se e deu-se de novo, sem qualquer perspetiva de solução estável. Para uma maioria absoluta de 68 deputados, o independentismo mais do que supera essa fasquia (74 deputados), mas por um lado as desavenças constantes entre a Esquerra e o Junts e, por outro, o radicalismo da CUP anunciam extremas dificuldades para a constituição de um governo. Mas entre toda a instabilidade reiterada, talvez esta solução ainda seja a mais estável, e meus senhores está tudo dito, lá teremos um governo de guerrilha que não acabará bem como os outros.

 

A vitória de Illa e do PSC é importante mas não deixa de ser uma vitória de Pirro. O não independentismo não forma maioria e um governo PSC, Esquerra Republicana e Junts é muito improvável ainda que teoricamente possível, não consigo imaginar sob que compromisso de negociação futura

Impressiona o colapso da direita não extremista e a continuada ascensão do espanholismo de direita extrema do VOX, aliás previsível. Tenho para mim que quanto mais assanhado se mostrar o independentismo mais o VOX se irá reforçar, oscilando os catalães não independentistas entre duas posições: encostando-se no passado ao CIUDADANOS e ontem ao PSC como opção de suster o independentismo ou entregando-se aos desígnios do VOX. Quem não perceber este conflito terá amargas consequências, até porque, mesmo admitindo que Illa não fez praticamente campanha e que a abstenção em pandemia pode ter várias interpretações, o PSC poderá aspirar talvez a 36 ou 38% do eleitorado mas não mais, o que prolonga a incerteza.

Resulta assim que só o PSOE pode ser a chave de todo este lio suicidário mas isso exigiria uma outra consolidação do seu poder a nível nacional e não é com a companhia do PODEMOS que a pode assegurar.

Com o independentismo, utópico ou não, a pairar cada vez mais sobre a Catalunha, antevejo dois cenários, aliás já presentes antes do ato eleitoral de ontem, que desse ponto de vista não trouxe nada de novo. Uma alternativa é o caos da degradação progressiva, que um governo com as forças independentistas irá acelerar. Não é de excluir a hipótese que esse caos possa também reforçar desentendimentos entre as forças independentistas, caos esse que a periclitante situação política espanhola a nível global pode acelerar. Outra alternativa é uma longa retomada da negociação política, criando um horizonte de maturação no longo prazo das perspetivas da independência, necessariamente nebuloso sem que constitucionalmente a Espanha resolva o problema da diversidade territorial identitária.

Claro que o indulto dos presos do Procès pode aliviar a tensão, mas não acredito que isso chegue para desatar o lio suicidário. Até lá o VOX agradece, reforçando-se e só espero que o colapso catalão do PP e do CIUDADANOS não se espalhe tal qual mancha de óleo para a realidade nacional espanhola.

Esta Espanha não está para moderados e, aqui ao lado, isso preocupa-me.

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