terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

CAPTAIN TOM MOORE

 


(Fico com a sensação de que com a morte aos 100 anos, por COVID-19, do Comandante Tom Moore, desaparece uma geração britânica que viveu as relações entre o outro lado da Mancha e a Europa segundo um outro ponto de vista, o da guerra e o da defesa dos valores mais profundos do Ocidente. Por ironia trágica. O NHS britânico não conseguiu talvez o impossível, prolongar a vida de quem reuniu no ano passado cerca de 36 milhões de euros de donativos para o sistema de saúde tão pressionado, tal como cá, pela terrível pandemia.)

            Se existe uma geração no Reino Unido que algum dia teve um sentimento de partilha dos valores mais profundos do ocidente com os Europeus foi a que viveu as agruras da Segunda Guerra Mundial. A história, a literatura e o cinema documentaram-nos com justiça como a resistência britânica foi crucial para impedir a ofensiva alemã e nessa resistência ainda muito se baseia a cooperação euro-americana, agora perturbada pelo BREXIT e pelo que pode representar de penalização nessa matéria.

O mesmo se aplica à geração europeia continental que viveu a mesma guerra. Ambas eram cruciais para compreender o alcance do projeto europeu e a sua importância para contextualizar o adento do Estado Social na Europa.

Dessa geração, lá e cá, restarão muito poucos, privilegiados pela dádiva divina ou astral de prolongamento da vida em condições de lucidez e empenho cívico.

O Comandante Tom Moore ficou conhecido nos tempos pandémicos de hoje pelas suas 100 voltas ao jardim comemorativas do seu centésimo aniversário e de homenagem ao Sistema Nacional de Saúde pelo seu esforço titânico de salvaguarda e proteção de vidas. A projeção mediática daquele ato singelo, mas terrivelmente simbólico e impactante, possibilitou a recolha de cerca de 36,6 milhões de euros para o NHS.

A sua morte aos 100 anos é também ela terrivelmente simbólica dos ventos de letalidade da pandemia e do seu foco nos mais velhos. Imagino a frustração do pessoal do NHS que recebeu o seu internamento em não conseguir prolongar-lhe a vida com qualidade como tão bem o tinha expressado nas suas 100 voltas simbólicas ao jardim.

Não faço a mínima ideia se o Ocidente no seu todo de defesa unânime dos valores da liberdade vai ser capaz de preservar a memória destas gerações que viveram a relação com a Europa nos tempos da guerra. Tenho a sensação de que se não formos capazes de honrar e preservar essa memória e esse exemplo também por aí o projeto europeu tenderá a desmoronar-se.

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