(Uploaded por Bernardo Pereira Cabral no Research Gate, link aqui)
(A referência ao Regional Innovation Scoreboard 2021, com dados de 2020, feita pelo meu colega de blogue é extremamente oportuna, sobretudo porque, como é devidamente assinalado no seu post, os indicadores do relatório de 2021 assinalam uma viragem no que de mais positivo os indicadores de 2020 revelavam. Um país globalmente classificado como fortemente inovador que integrava três regiões NUTS II com esse estatuto, Norte, Centro e Lisboa representava o resultado de uma evolução fortemente ancorada nos Fundos Europeus de apoio à I&D e Inovação e tinha nas NUTS III Região de Aveiro, Região de Coimbra, Área Metropolitana de Lisboa, Área Metropolitana do Porto, Cávado e Ave os seus principais expoentes. Em termos práticos, o Regional Innovation Scoreboard 2021 configura uma mudança de série e por isso as comparações com os últimos 5 anos implicam uma arqueologia de interpretação de informação que está para além do contributo que este blogue pode oferecer. Mas que se trata de um alerta disso não tenho dúvidas e até podem ser identificadas razões válidas para compreender esse alerta e atalhar pela direção certa.)
Em indicadores como o European e o Regional Innovation Scoreboard existe um fenómeno que me atrevo a designar de fadiga do próprio indicador. A inovação é um fenómeno intrinsecamente evolutivo e por isso é praticamente impossível encontrar um conjunto estável de indicadores que representem de forma também estável o estado da arte do desempenho dos países e das regiões nessa matéria. É natural, em meu entender, que uma longa duração do quadro de indicadores implique com o tempo uma certa dificuldade de identificar diferenças de desempenho. Afinal, não é verdadeiramente apenas de inovação que devemos falar, é pelo contrário do binómio inovação-difusão (a absorção é um outro rosário). É na fronteira tecnológica, ou seja onde o progresso tecnológico é comandado e decretado, que se marca a diferença. Por isso, mais tarde ou mais cedo os indicadores (a métrica) tem de mudar para melhor representar o que se passa na frente e, com isso, medir melhor as distâncias a que se encontram os que seguem, mais rápida ou mais lentamente, os campeões da fronteira.
Por isso, é muito provável que quando as mudanças se operam na métrica, haja regiões que vêm obviamente piorar a sua posição relativa. Isso não significa como é natural que possa haver pior desempenho nos indicadores que permanecem. E já agora temos também de nos habituar a compreender o que é que vai representar para a média europeia a saída do Reino Unido e a consequente retirada da comparação de zonas tão inovadoras como a região de Cambridge.
Assim sendo, podemos dizer que o Regional Innovation Scoreboard representa uma quebra de série. Não é nada do outro mundo, isso acontece frequentemente com outros indicadores e o remédio é dar corda aos sapatos e trabalhar na interpretação das diferenças.A tabela seguinte é uma tentativa ainda modesta de comparar indicadores que desaparecem e indicadores que são introduzidos de novo, com algumas observações:
Novos indicadores RIS 2021 |
Indicadores RIS que desapareceram |
Observações |
Digitalização Indivíduos com competências digitais básicas acima da média |
Ambiente amigável para a inovação Empreendedorismo baseado na oportunidade |
O novo indicador é mais objetivo e pressuponho que penaliza a posição portuguesas e das suas regiões |
Investimento – Financiamento Financiamento governamental direto e apoio em termos fiscais a I&D empresarial |
|
Pressuponho que o novo indicador penaliza a posição portuguesa dado o efeito determinante dos Fundos Europeus e não de Fundos Governamentais |
Investimento empresarial Despesas de inovação por pessoa empregada em empresas ativas em inovação |
Investimento empresarial Empresas que fornecem formação para desenvolver ou melhorar as competências em TIC para o seu pessoal |
A mudança de indicador implica na minha interpretação passar de um indicador obtido por inquirição a um outro com recolha mais objetiva |
Uso de tecnologias de informação Empresas que fornecem formação para desenvolver ou melhorar as competências em TIC para o seu pessoal (recuperado) Especialistas empregados em TIC |
Representado parcialmente noutra dimensão |
Idem |
Inovadores PME com inovações processo |
Inovadores PME com inovações de marketing ou organizacionais PME com inovação in-house |
Seguramente que esta alteração penalizou a posição portuguesa: temos de convir que a resposta ao inquérito Comunitário à Inovação tendia a alargar o critério |
Relações de articulação (Linkages) Cofinanciamento privado de despesas públicas de I&D |
Relações de articulação (linkages) Mobilidade entre postos de trabalho de Recursos Humanos em Ciência e Tecnologia |
Claramente que penalizador da posição portuguesa, pois o cofinanciamento privado de I&D pública não é lá nada animador |
Impactos em termos de emprego Emprego em empresas inovadoras |
Impactos em termos de emprego Emprego nas empresas com crescimento mais rápido de setores inovadores |
Sinceramente não consigo antecipar qual o impacto desta mudança |
Sustentabilidade ambiental Produtividade dos recursos Emissões de partículas finas PM2 5 na indústria Desenvolvimento de tecnologias relacionadas com o ambiente |
Não estava representada |
Pressupõe-se que a nova dimensão apanha a economia portuguesa em estádio de transição |
Teremos pois de acumular informação para compreender melhor o nosso posicionamento futuro.
Mas, perguntemo-nos, podem existir razões objetivas para alguma estagnação ou até recuo da muito positiva evolução do desempenho inovação da economia portuguesa?
Isso é matéria para outro post, mas em meu entender e sem sobressaltos acho que sim. Limito-me a enunciar alguns desses fatores, prometendo voltar ao assunto ainda nestas férias, isto se o sol não convidar a outros exercícios mais saudáveis:
- O sistema de inovação em Portugal tem problemas sérios de governação e a transição para uma nova administração da Agência Nacional de Inovação não augura nada de muito promissor;
- Podemos estar numa fadiga de envolvimento de empresas em atividades colaborativas e mobilizadoras de I&D nas NUTS III, anteriormente assinaladas, e que conduziram a melhoria do RFIS nos últimos anos;
- Os Fundos Europeus foram decisivos mas podem não ter alavancado o investimento de recursos não cofinanciados ou essencialmente destinados aos programas europeus em que mandam os tubarões;
- O sistema científico pode ter uma recaída e recentrar-se de novo na investigação científica para mérito ver e as empresas que se danem, que explicitem bem o que querem;
- O sistema de mérito nas Universidades choca de frente com a cultura de inovação.
Matéria que chegue para alguns posts.
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