Mais de três décadas após a morte de Jacques Brel, em 2005 eleito “le plus grand Belge de tous les temps”, “le plat pays qui est le mien” busca desesperadamente uma saída político-institucional. É vertiginosa, desencontrada e irracional a cadeia de episódios ligada a tentativas de constituição de um governo, no quadro de um complexo sistema de missões “de informação”, “de formação” ou “de exploração”; adicionou-se agora (ao dia número 527 da crise aberta após as eleições de Junho de 2010!) a demissão de Elio di Rupo, nomeado para formar governo desde Maio.
Na complexa nebulosa constitucional e partidária em que se transformou o Reino de Alberto II – entre grandes partidos duplicados por razões comunitárias e linguísticas e partidos radicais nacionalistas e separatistas (como o ultra Vlaams Blok), entre obrigatórios acordos interpartidários nas e entre as regiões e paridades linguísticas a todos os níveis político-administrativos ou entre a exigência de um primeiro-ministro bilingue e de um “equilíbrio” entre ministros falantes de flamengo e de francês – já nem foi possível fazer passar a hipótese de uma “rainbow coalition” entre seis partidos (socialistas, liberais e cristão-democratas flamengos e valões)!
A questão tem raízes históricas conhecidas e fundamentos económicos objectivos. De um lado, o ressentimento nacionalista dos flamengos face a todo um passado de dominação industrial, linguística, política e cultural das elites francófonas; o qual foi até à infrutífera colaboração com os ocupantes nazis. Do outro, a sua insaciável reivindicação por consequências do crescente contraste entre um Norte dinâmico e próspero e um Sul em declínio pós-industrial e vivendo de um sistema de segurança social pago por impostos generosamente administrados.
Deste ponto de vista, nada tem detido essa pressão separatista de que é símbolo o conflito que levou a dividir a Universidade de Leuven e a criar a de Louvain-la-Neuve. Nem o direito a falar a própria língua nos assuntos públicos ou a posterior imposição da mesma. Nem as “conquistas” de sete revisões constitucionais em trinta anos: formalização de três “Regiões” (Flandres, Valónia e Bruxelas-Capital) com parlamento próprio, institucionalização de três “Comunidades” linguísticas (expressão flamenga, francesa e alemã) e concentração de poder nessas instâncias. Nem mesmo o carácter anedótico de ineficientes regras de proporcionalidade e igualdade de tratamento (sobreposição de serviços, contribuições e marcas de toda a ordem) ou o custo (uma das maiores dívidas públicas da UE em percentagem do PIB) de um tal “mosaico desordenado”.
Ainda que minorada por sinais de abertura (transição geracional, educação, atenuação religiosa, novos residentes, evolução do mundo), a questão de fundo não foi significativamente dissipada. E o país vive “de costas voltadas”, destituído de qualquer energia colectiva – vejam-se, paradigmaticamente, os casos de meios de comunicação social só direccionados às comunidades linguísticas em que se inserem e sem expressão fora delas ou das agressivas provocações de Yves Leterme (líder do CD&V, partido cristão-democrata flamengo) ao afirmar não estarem os Valões “em estado intelectual de aprender o flamengo” ou ao compará-los a “um saco de pedras” entravando a marcha de uma Flandres próspera.
Não obstante irem surgindo argumentos separatistas mais racionais (focados num apoio temporário à Valónia ou num esvaziamento da extrema-direita) e contra-argumentos mais emocionais (da “terrível amputação” à indesejabilidade de uma “petite Belgique”), até que ponto ainda relevará a proclamação do hino (“Nous le jurons tous, tu vivras!”) e a defesa dos laços que unem Flandres e Valónia (cada região sendo a principal cliente da outra) em manifestos tipo “Je t’aime moi non plus”? Ou irá prevalecer o facto de o inglês ser a língua comum mais falada numa Bélgica cujas fronteiras externas se esbatem em escalas europeias mais compagináveis com a gestão da diversidade interna?
De um ou de outro modo, parece inteiramente justificável o reformulado “Astérix chez les Belges” em título. E também, cada vez mais, a atenção à placa “Danger” – porque os mercados “andam por aí”…
Na complexa nebulosa constitucional e partidária em que se transformou o Reino de Alberto II – entre grandes partidos duplicados por razões comunitárias e linguísticas e partidos radicais nacionalistas e separatistas (como o ultra Vlaams Blok), entre obrigatórios acordos interpartidários nas e entre as regiões e paridades linguísticas a todos os níveis político-administrativos ou entre a exigência de um primeiro-ministro bilingue e de um “equilíbrio” entre ministros falantes de flamengo e de francês – já nem foi possível fazer passar a hipótese de uma “rainbow coalition” entre seis partidos (socialistas, liberais e cristão-democratas flamengos e valões)!
A questão tem raízes históricas conhecidas e fundamentos económicos objectivos. De um lado, o ressentimento nacionalista dos flamengos face a todo um passado de dominação industrial, linguística, política e cultural das elites francófonas; o qual foi até à infrutífera colaboração com os ocupantes nazis. Do outro, a sua insaciável reivindicação por consequências do crescente contraste entre um Norte dinâmico e próspero e um Sul em declínio pós-industrial e vivendo de um sistema de segurança social pago por impostos generosamente administrados.
Deste ponto de vista, nada tem detido essa pressão separatista de que é símbolo o conflito que levou a dividir a Universidade de Leuven e a criar a de Louvain-la-Neuve. Nem o direito a falar a própria língua nos assuntos públicos ou a posterior imposição da mesma. Nem as “conquistas” de sete revisões constitucionais em trinta anos: formalização de três “Regiões” (Flandres, Valónia e Bruxelas-Capital) com parlamento próprio, institucionalização de três “Comunidades” linguísticas (expressão flamenga, francesa e alemã) e concentração de poder nessas instâncias. Nem mesmo o carácter anedótico de ineficientes regras de proporcionalidade e igualdade de tratamento (sobreposição de serviços, contribuições e marcas de toda a ordem) ou o custo (uma das maiores dívidas públicas da UE em percentagem do PIB) de um tal “mosaico desordenado”.
Ainda que minorada por sinais de abertura (transição geracional, educação, atenuação religiosa, novos residentes, evolução do mundo), a questão de fundo não foi significativamente dissipada. E o país vive “de costas voltadas”, destituído de qualquer energia colectiva – vejam-se, paradigmaticamente, os casos de meios de comunicação social só direccionados às comunidades linguísticas em que se inserem e sem expressão fora delas ou das agressivas provocações de Yves Leterme (líder do CD&V, partido cristão-democrata flamengo) ao afirmar não estarem os Valões “em estado intelectual de aprender o flamengo” ou ao compará-los a “um saco de pedras” entravando a marcha de uma Flandres próspera.
Não obstante irem surgindo argumentos separatistas mais racionais (focados num apoio temporário à Valónia ou num esvaziamento da extrema-direita) e contra-argumentos mais emocionais (da “terrível amputação” à indesejabilidade de uma “petite Belgique”), até que ponto ainda relevará a proclamação do hino (“Nous le jurons tous, tu vivras!”) e a defesa dos laços que unem Flandres e Valónia (cada região sendo a principal cliente da outra) em manifestos tipo “Je t’aime moi non plus”? Ou irá prevalecer o facto de o inglês ser a língua comum mais falada numa Bélgica cujas fronteiras externas se esbatem em escalas europeias mais compagináveis com a gestão da diversidade interna?
De um ou de outro modo, parece inteiramente justificável o reformulado “Astérix chez les Belges” em título. E também, cada vez mais, a atenção à placa “Danger” – porque os mercados “andam por aí”…
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