Em duas obras
separadas por quatro anos, One Economics, Many Recipes (2007) e The Globalization
Paradox (2011), o economista americano Dani Rodrik desenvolveu a
tese conhecida pelo “trilema de Rodrik”. O sub-título da obra de 2011, “Porque é
que os mercados globais, os Estados e a Democracia não podem coexistir”, situa exemplarmente
o alcance da tese. Segundo o autor, não seria possível assegurar em simultâneo
o aprofundamento da globalização, sobretudo na sua dimensão económica e
financeira, a manutenção de regimes democráticos e a presença continuada do Estado-Nação
como forma predominante de governação e de gestão de mecanismos de regulação
económica e política.
Haverá espaço neste blogue para noutras oportunidades regressar ao tema e sobretudo ao que ele
significa: fundamentado que esteja o trilema, então um dos seus três vértices poderá
cair. Por agora, vale a pena sublinhar a força desta tese para nos ajudar a
situar na falência da regulação mundial (europeia em primeira linha, mas também
“mundial” pelo menos na perspectiva do grupo G20 e do impasse que caracterizou
a cimeira de Cannes. Dois dos vértices do triângulo de Rodrik revelam nos
tempos mais recentes uma evidente fragilidade, podendo discutir-se qual dos
dois cairá primeiro. Em primeiro lugar, a tentativa de manter simultaneamente o
estado de integração económica e financeira que marcou a última fase de
globalização e a abordagem corrente à crise das dívidas soberanas ameaça, em
muitos países, a preservação da democracia política. No post anterior, procurei
evidenciar em que medida a tentativa em curso de regular a crise das dívidas
soberanas está a minar a estabilidade política e a comprometer a saúde dos
sistemas democráticos mais atingidos pelo problema. Depois, é flagrante que
existe um vazio institucional na procura de soluções que visem compensar a
incapacidade dos Estados-Nação individualmente resolverem o problema. A deriva
política no seio da União Europeia e do Euro-Grupo consiste no completo
esvaziamento do seu contexto institucional: o apagão da Comissão Europeia e a
inoperacionalidade dos apêndices criados no seu modelo de governação e a sua
substituição democraticamente não validada por directórios de facto ilustram
cruamente o vazio institucional em que a construção europeia está mergulhada.
Mas o argumento de
Rodrik continua mesmo neste âmbito estritamente europeu a conduzir a reflexão
crítica. A profunda aceleração do processo de alargamento do mercado único
europeu (integração económica e financeira) passou a colidir frontalmente quer
com a fragilidade do quadro institucional capaz de governar (regular) esse
aprofundamento, quer com a preservação de algumas conquistas democráticas. Os
desequilíbrios permanentes na zona euro (economias permanentemente excedentárias
versus economias permanentemente deficitárias) ilustram essa colisão. O choque
entre a dimensão mais avançada da construção europeia (a lógica do mercado único,
ou seja, da globalização à escala europeia) e outros projectos que têm perdido
força, tais como a Europa dos Povos, a Europa Social ou a Europa das Regiões e
dos Territórios não são mais do que a manifestação dessa colisão. E tal como
Rodrik o sugere as saídas progressivas não poderão deixar de ser a necessidade
de domesticar a integração económica e financeira e/ou o retorno a soluções
institucionais que não comprometam a solidez democrática do projecto europeu. Voltaremos
a este argumento.
Sem comentários:
Enviar um comentário