terça-feira, 8 de novembro de 2011

A MEIO DO COURT


Um jogador de ténis mesmo que mediano ou então qualquer entusiasta não praticante da modalidade sabe que na dinâmica do jogo há uma posição que se deve evitar a todo o custo – o meio do court. Apenas predestinados e mesmo esses em situações de excepcionalidade conseguem superar a extrema vulnerabilidade dessa posição. Essa vulnerabilidade acontece por contraponto à posição de fundo de court, que implica perseverança, robustez e consistência de jogo e à de jogo de rede, mais arriscada, de conclusão mais rápida.
A metáfora do ténis ocorre-me para descrever as soluções inconsistentes que a chamada governação por cimeiras tem desenvolvido para superar os diferentes desequilíbrios que abalam a maioria dos sub-grupos ou espaços em que a economia mundial está estruturada: Zona Euro, União Europeia, Estados Unidos da América e economia mundial como um todo. Na verdade, subjacente a todas as formas de instabilidade instalada, existem desequilíbrios de monta e que não são passageiros. Em termos mais prosaicos, a existência de excedentes e défices mais ou menos persistentes entre espaços ilustra que não são ajustamentos simples ou simples ajustamentos que os permitem ultrapassar. Vale a pena aplicar este referencial a grupos de países específicos na zona euro. O confronto entre o défice externo corrente conjunto do grupo Portugal, Grécia, Espanha e Itália e o excedente alemão é surpreendente (ver a reflexão recente de Krugman sobre esta matéria - http://krugman.blogs.nytimes.com/2011/11/07/wishful-thinking-and-the-road-to-eurogeddon/?scp=3&sq=Krugman%20blog&st=cse, retomando a de Gavyn Davies no Financial Times - http://blogs.ft.com/gavyndavies/2011/11/06/the-eurozone-decouples-from-the-world/#axzz1d0Hun5-RB.
Há alguns anos atrás ensinava-se que tudo isto devia ser compreendido no quadro de uma dada ordem económica internacional. Hoje, a experiência mostra que a governação por cimeiras se alimenta de impulsos mais ou menos inconsistentes.
A comparação com a metáfora do meio do court justifica-se. Nos impulsos de cimeiras não se vislumbra nem a aproximação a uma nova arquitectura institucional de longo prazo (robusta como o jogo de fundo de court), nem a aceleração de um conjunto de medidas capazes de suster a instabilidade (matar a jogada na rede). A mediatização desse modelo de governação por impulsos mina a própria consistência do modelo. À tensão mediática da criação de expectativas em torno de encontros marcantes correspondem vazios de decisão, agravando a vulnerabilidade das situações. E, em coerência com esse modelo, as instituições que já corporizaram uma ordem económica internacional (a de Bretton Woods) esvaziam-se, apagam-se, produzindo autênticos apagões nos períodos inter-cimeiras. É de facto necessário muito optimismo para esperar, como alguns observadores o admitiram, que estivesse eminente um novo Bretton Woods, capaz de acomodar os novos desequilíbrios inter-espaços económicos alargados. Mas onde está o pensamento de base que possa suportar a desejada nova arquitectura institucional? Quem hoje poderia assumir o papel que Keynes assumiu na gestação de Bretton Woods?
Com toda esta definição, o apelo às economias emergentes para jogar um papel activo quer na alimentação do FEEF europeu, quer ainda na própria estruturação da economia mundial, soa a esperteza cínica. Pode perguntar-se que nova arquitectura institucional poderia enquadrar essa participação mais activa das economias emergentes? Só no âmbito de uma solução de mais longo prazo, na qual o papel dessas economias fosse devidamente assumido, teria sentido esse apelo. Não havendo indícios que essa discussão esteja a ser preparada, a incapacidade europeia de ir ao fundo do seu próprio problema tenderá apenas a afastar as economias emergentes de uma participação de circunstância. Vender sucedâneos mal amanhados de um “Consenso de Washington” em agonia e contrariado pelas evidências empíricas não será produto facilmente comprado por tais economias.

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