sexta-feira, 29 de julho de 2016

A DESIGUALDADE COMO SEQUELA DOS AJUSTAMENTOS EUROPEUS




(Enquanto não termino a leitura do relatório FMI de avaliação independente do programa de ajustamento em Portugal, em cuja equipa se destaca o nome do economista português Sérgio Rebelo, há já números oficiais que colocam bem em evidência uma das sequelas dos programas de ajustamento, a desigualdade.)

O relatório de avaliação independente promovido pelo FMI sobre o programa de ajustamento em Portugal, aliás extensivo a todos os programas europeus, é de leitura obrigatória. O prestígio entre pares americanos do economista Sérgio Rebelo, que pode ser conotado contudo menos com perigosos desvios esquerdistas, projeta no relatório um interesse inequívoco, do qual me ocuparei em posts muito próximos, agora que alguns dias de férias da consultadoria me permitirão recuperar leituras que ficam para trás, na lufada calorenta destes dias.

Mas a própria União Europeia tem publicado informação relevante sobre um dos critérios possíveis de avaliação dos programas de ajustamento, a evolução da desigualdade. Michael Dauderstädt e Cem Keltek no Social Europe de hoje, que acaba de me chegar à caixa de correio eletrónico, focam essa sequela dos programas de ajustamento. Em termos muito simples, recorrem a um dos indicadores de medida da desigualdade na distribuição do rendimento mais utilizados, o rácio 80%/20%, que mede o rácio entre as proporções de rendimento apropriadas pelos 20% mais ricos e pelos 20% mais pobres e analisam também as taxas de crescimento do rendimento dos quintis de distribuição do rendimento (populações estruturas em cinco grupos iguais ordenados dos mais pobres para os mais ricos. Fazem-no comparando sempre os valores em termos nominais e à paridade dos poderes de compra, como recomenda a precaução.

As evidências apontam para que a partir de 2009, em termos médios na União e consequentemente com todas as imperfeições associadas a uma média que oculta desvios significativos entre países (com Portugal e os países bálticos à frente da desigualdade europeia), se assiste a um novo paradigma de desigualdade europeia, com agravamento da mesma.

E o que parece mais relevante é a comparação dos ritmos de crescimento do rendimento por quintil de população entre os estados-membros. É visível o confronto norte-sul, bastante desfavorável a este último.





Mas há aqui um elemento que confirma as análises desenvolvidas pelo grupo de trabalho em que estou inserido (Pilar González, Luis Delfim Santos e Hugo Figueiredo). Os quintis intermédios em Portugal viram a sua posição de crescimento do rendimento relativamente preservada, o que contrasta com os restantes países do ajustamento. Este tema de investigação continua relevante pois não cola facilmente com o discurso da degradação da posição relativa das classes médias de que tanto se fala mas tão pouco se investiga.

Sem comentários:

Enviar um comentário