(Quem não quiser
jogar o jogo da imagem e cada um está no seu inalienável direito de não o
querer, tem de ser coerente com
tal posição, o que não é sempre o caso)
Muito sinceramente
estava a estranhar que ninguém o tivesse utilizado como matéria jornalística ou
de comentário. Eu próprio já o tinha referenciado como algo a discutir, mas
algum pudor na exploração desse tipo de matéria-informação fez-me adiar
sistematicamente essa possibilidade. Mas agora que o jornalista Manuel Carvalho
publicou um contundente artigo sobre o facto, está quebrado o princípio da primeira
vez e acho-me com o direito de o comentar.
Primeiro,
uma declaração de conflito de interesses. Não conheço pessoalmente Mário
Centeno, o ministro das Finanças do governo de António Costa. Nunca com ele
trabalhei ou tive qualquer relação profissional. Tenho aliás muita admiração académica
pela sua produção na economia do trabalho e considero-o o universitário que
melhor conhece e tem trabalhado a segmentação do mercado de trabalho em
Portugal. Por outro lado, já aqui referi que não me parece o melhor perfil possível
para o lugar de ministro das Finanças, aliás na linha do que se tornou obsessão
em alguns dos meus posts, ou seja no
enorme vazio que se verifica no universo PS em termos de personalidades e vocações
para exercer tal cargo. Depois, para desgraça do atual ministro, não me parece
que o Secretário de Estado Mourinho Félix represente a tal barreira protetora que
qualquer ministro das Finanças necessita, que mais parece incendiar novos fogos
do que contribuir para apagar os já declarados. Depois e em sua defesa, Centeno
teve de aplicar uma combinação de políticas que não era seguramente a sua para
dar corpo ao acordo parlamentar à esquerda, o desvirtuou em grande medida o
programa cuja elaboração ele próprio coordenara. Por conseguinte, o contexto em
que Mário Centeno se teve de fazer à vida enquanto ministro não se deseja ao
nosso inimigo nº1 e isso bastaria para reformatar as nossas expectativas.
Como todos
sabemos, há ministros que se abatem ou menorizam pela palavra, seja ela
descontrolada e impensada ou tímida e carenciada de tempo de resposta e clareza.
Não me parece ser esse o caso de Mário Centeno. Ele domina relativamente o que
quer dizer, mesmo que seja por vezes inexpressivo e monótono. Mas não é por aí
que a sua posição seja debilitada. Num tempo da política em que a imagem se
sobrepõe ao texto, Centeno, particularmente nas reuniões com os seus congéneres
europeus, mostra um fácies seguramente dissonante do que nós dele conhecemos
enquanto universitário e investigador, clarividente, rigoroso, não receando os
resultados politicamente incómodos da sua própria investigação. De facto, sobretudo
nas reuniões do Euro grupo e do Ecofin, Centeno parece frequentemente aquele adolescente
que tem de ultrapassar as barreiras do seu primeiro encontro social, gerando um
sorriso-esgar que na sua postura é seguramente um antídoto contra a sua timidez
e pouco à vontade. O artigo de Manuel Carvalho é talvez injusto e ofensivo,
pois usa essa mesma observação que já me saltara aos olhos para daí deduzir
subserviência relativamente aos seus colegas do Ecofin, para tragédia nossa num
momento em que não se pediam sorrisinhos de circunstância, mas uma posição clara
e firme. Fosse António Costa a entrar com o cachecol da seleção ao pescoço e ninguém
se lembraria de associar tal postura ao que Manuel Carvalho expressou. Mas há
imagens que ficam para sempre nas nossas memórias de voyeurs políticos, tal
como a de Vítor Gaspar baixando-se para saudar Schäuble na sua cadeira de rodas.
E, neste caso, por mais voltas que o mundo dê, não será o artigo de Manuel
Carvalho que será lembrado, mas antes as imagens do rosto de Centeno. É terrível,
é injusto, não é disto que a verdadeira política se deveria alimentar, saudavelmente.
Também me parece. Mas quem não quer ser lobo, ou melhor neste caso, quem não
quer dar mostras de cordeirinho indefeso, não lhe veste a pele, ou seja tal
sorriso.
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