(O artigo que me serve de inspiração, “Why we should bulldoze the business school”,
publicado no Guardian já há algum tempo e que me foi sugerido há poucos dias
pelo meu amigo e sempre atento Professor Leonardo Costa, suscita uma leitura
que causa alguns arrepios. Mas uma camisola confortável resolve o problema e o tema é imperdível.)
Nos últimos dias, as minhas leituras e reflexões
têm sido um pouco erráticas e daí a aparente excentricidade da crónica de hoje.
Antes de mais justifica-se um aviso. Pode parecer mau gosto trazer este
tema para este espaço de reflexão, quando há ainda bem pouco tempo a Porto Business School (PBS) fez 25 anos,
ao que me dizem com a presença simpática de muitos dos meus amigos que estiveram
mais diretamente ligados ao projeto. Longe de mim ser desmancha-prazeres, pois
embora não tenha neste momento quaisquer referências sobre o seu modo de
funcionamento e aspirações considero que é uma instituição que merece ser
acompanhada. Longa vida por isso à PBS. Só espero que alguns dos tons mais
negros que o artigo de Martin Parker (link aqui) suscita não tenham nesta BS qualquer hipótese
de cultivo.
Confesso que a minha grande referência sobre esta matéria é anterior à crise
de 2007-2008 a partir da qual os aspetos da ganância e da deriva do capitalismo
sofreram um compreensível assalto de atenção. Em 2004, um grande senhor destas
matérias da gestão e da organização, Henri Mintzberg, daqueles em que o que
escreve compensa toda a cacofonia inútil que se passeia regularmente pelos
campos do management, escreveu uma obra demolidora “MANAGERS
NOT MBAS – A hard look at the soft practice of managing and management
development”, editada em parceria pela Financial Times e pela
Prentice Hall. Estou longe de saber que impacto teve essa obra demolidora na
formação em gestão. Não deve ter sido simpática a reação que ela provocou na máquina
endinheirada dos MBA’s. Na altura, apercebi-me que pelas bandas da FEP e das hostes
da gestão ninguém praticamente tinha acusado o toque, pois ignorar as obras demolidoras
é coisa que dá muito jeito.
Cerca de 14 anos mais tarde, alguém com experiência diversificada de ensino
em BS escreve um artigo para um jornal credível como o Guardian, antecipando uma
obra “Shut Down the Business School – What’s wrong
with management education”, Pluto Press, que foi revista pelo
Financial Times em 22 de junho de 2018 (link aqui).
A análise de Parker é demolidora, embora devesse ser confrontada com a necessidade
de uma melhor evidência dos traços de funcionamento e de conteúdos de formação,
até porque estamos a falar um universo a nível mundial que anda pelas 13.000 escolas.
O facto das BS representarem na formação avançada e executiva uma fonte apreciável
de receitas, em confronto com as dificuldades de geração das mesmas por parte das
universidades e outros estabelecimentos de ensino superior, sempre, com a exceção
das universidades do top 10 mundial, às voltas com as condições de financiamento
público, tem-lhes concedido um estatuto relativamente à parte na formação superior.
Mas se é verdade que, pelo prisma da sua capacidade de geração de receitas, as
BS tendem a distanciar-se das universidades em que poderiam estar inseridas, a verdade
é que nos tempos mais recentes há BS a aproximarem-se de novo do ninho
universitário. Esta reaproximação tem que ver com a geração de conhecimento que,
regra geral, as BS não são muito pródigas a gerar, dado a baixa intensidade de
investigação que nelas tende a observar-se. Para além disso, a Universidade
transformou-se substancialmente em termos da sua propensão e disponibilidade para
se aproximar dos meios empresariais, não só em termos de formação mas também em
termos de investigação.
Os argumentos de Parker são demolidores sobretudo do ponto de vista dos
gestores que estarão a ser formados, não só em termos técnicos, mas também em
termos de modelos de comportamento e de sistemas de valores que estão a ser lançados
para o mercado da competição. Estamos de novo num período em que se discute a
base moral do capitalismo, tamanha é a deceção que certos comportamentos
empresariais estão a provocar em visões mais abrangentes do capitalismo e da sua
capacidade de se reinventar. Vale a pena citar: “O
tipo de mundo que está a ser produzido pelo “market managerialism” que a business
school vende não é muito agradável. É uma espécie de utopia para os ricos e
poderosos, um grupo ao qual os alunos são encorajados a juntar-se, mas esse
privilégio é adquirido a um custo elevado, com efeitos de catástrofe ambiental,
recursos de guerras e migrações forçadas, desigualdade no interior e entre países,
estímulo do hiperconsumo assim como práticas persistentemente antidemocráticas
em ação.”
Parker invoca um inquérito realizado nos EUA (no artigo do Guardian a fonte
não é identificada), onde as BS mais se disseminaram, que comparou experimentalmente
estudantes de MBA com indivíduos presos em prisões de baixa segurança, o qual
concluiu que os reclusos tinham um padrão ético mais consistente. E outro inquérito
citado mostrava que a probabilidade de cometer um crime empresarial aumentava com
a frequência de um MBA ou de serviço militar. Parker distancia-se de interpretações
demasiado seguidistas destes exercícios de inquirição, mas lá vai recordando uma
afirmação que cosntou de um editorial de 2009 do Economist, dirigido às BS, e que ficou célebre nos meios da pós-graduação:
“Não podem reivindicar que a vossa missão seja a de educar
os líderes que fazem a diferença para o mundo e depois lavar as mãos quando os
vossos alunos se diferenciam por práticas pouco recomendáveis.”
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