(O reconhecimento da valia cientifica da biodiversidade que
a atribuição do Prémio Pessoa deste ano a Miguel Bastos Araújo é uma boa notícia
para os desafios que a sustentabilidade nos coloca. Sintonizado nos últimos tempos com o tema da
economia circular e da descarbonização em geral, compreendo que o país científico
está a despertar para este desafio.)
Tinha algum conhecimento do prestígio científico internacional de Miguel Bastos
Araújo, mas estava longe de conhecer todo o alcance da obra do biogeógrafo. A sua
longa entrevista à Revista do Expresso na sequência da atribuição do Prémio
Pessoa é uma honesta e significativa homenagem à ciência e objetivamente à dificuldade
de a praticar em Portugal. Honesta porque ela transmite aos inúmeros jovens que
despertam hoje em Portugal para uma carreira científica uma imagem realista do
que vão encontrar na sua tarefa. Em primeiro lugar, algo de obsessivo (“ninguém
consegue criar conhecimento novo se não passar mais de 10.000 horas num tema”),
avisando para a vida de trabalho que vão encontrar. Mas também algo de errático,
na sequência da falta de pronunciamento do país sobre o papel que quer efetivamente
desempenhar na ciência, europeia e mundial, e por isso sujeito às flutuações de
bom ou mau humor dos orçamentos públicos e de quem os domina, as Finanças.
Uma entrevista de defesa do espírito e da identidade europeus, descobertos
por via da ciência e do reconhecimento internacional que se tem sobreposto ao
nacional. Interessantes reflexões sobre a dimensão cultural dos valores da
biodiversidade e sobretudo uma perspetiva do tempo longo que me agrada fortemente,
dadas as condições de diálogo com o tempo longo da história e do desenvolvimento.
Estou em crer que estamos perante uma das escolhas mais inteligentes do júri
do Prémio Pessoa e que reflete o valor imenso da biodiversidade ao qual temos
dado pouco valor quando confrontados com outros domínios da sustentabilidade.
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