sexta-feira, 17 de maio de 2019

ESPANHA VAZIA E LAPÓNIA DO SUL



Não é que o mal dos outros nos possa valer de muito nas nossas próprias aflições. Nem mesmo se esse mal até possua alguns traços piores do que o nosso. Mas sempre vale a pena confirmar – neste caso com a ajuda de uma excelente peça e reportagem do “La Razón” – que o problema demográfico é muito sério e grave nas sociedades em que vivemos e que, podendo ele ser difícil de enfrentar ou até tendencialmente impossível de resolver, não é mais pensável que se limite a servir de um bom mote para que a maioria dos nossos responsáveis elaborem em torno, nomeadamente dedicando o seu tempo à realização de alguns exercícios de estilo em nome do interior e de uma proclamada coesão territorial.

Em Espanha, onde tudo é sempre mais conflitual do que entre nós (para o bom e para o mau, sublinhe-se), aconteceu há cerca de mês e meio uma manifestação convocada para o centro de Madrid por 90 associações no sentido de reivindicar medidas efetivas contra o despovoamento, i.e., a marginalização e o abandono. Alguns números: 53% do território espanhol com apenas 5% da população total e 30% do território a concentrar 90% da população, por um lado; alastramento do despovoamento para fora das zonas rurais, atingindo capitais de comarca e cidades médias (casos mais gravosos nas Astúrias, na Andaluzia – Jaén, p.e., em Castela Mancha – Albacete, p.e. e em Castela e Leão – declínio populacional evidente em Ávila, Burgos, Sória e Zamora), e situações extremadas em 78 mil localidades com menos de 100 habitantes (mais 23 mil do que há vinte anos), por outro lado.


O texto trata mais em detalhe o exemplo da chamada Serranía Celtibérica (também curiosamente designada por Lapónia do Sul), uma região montanhosa com mais de 63 mil quilómetros quadrados, integralmente interior e de muito baixa densidade (480 mil habitantes, i.e., 1% da população de Espanha e menos de 10 pessoas por quilómetro quadrado) e abarcando 1632 municípios repartidos por dez províncias e cinco comunidades autonómicas (a saber: Teruel e Zaragoza em Aragão, Cuenca e Guadalajara em Castela Mancha, Burgos, Segóvia e Sória em Castela e Leão, Castellón e Valencia na Comunidade Valenciana e La Rioja – ver mapa abaixo). A hierarquia de esvaziamento urbano é liderada por Sória (88,6 mil habitantes), sucessivamente seguida por Teruel, Segóvia, Ávila e Palência (todas ainda bem acima dos 100 mil habitantes, na realidade entre 135 e 162 mil). Quanto ao mais, as causas comuns são as de sempre, para lá das pequenas especificidades de cada caso: baixa fertilidade (1,33 filhos por mulher), aumento da mortalidade (por concentração de idosos – quase 20% da população tem mais de 65 anos) e emigração crescente. Tal como acontece com o diagnóstico de faltas: acessibilidades (agora também comunicacionais), serviços básicos (saúde à cabeça), empregabilidade económica.

E mais não acrescento. Até porque hoje só pretendi daqui contribuir para desassossegar as boas consciências que ainda por aí possam andar, sobretudo algumas que talvez acreditem piamente que também há vantagens no fenómeno: desde logo, àquelas paragens já quase não há margem para fazer chegar a demagogia e, com ela, o insuportável populismo que de todo o lado nos invade...


(José Manuel Esteban, http://www.larazon.es)

(José Manuel Esteban, http://www.larazon.es)

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