sexta-feira, 24 de maio de 2019

EUROPEIAS



(Um fim de semana relaxado em Seixas para recarregar baterias, estar com amigos, recuperar leituras em falta, para rumar, depois, no domingo, às mesas de voto e cumprir o dever que a Europa justifica. Oportunidade para refletir o que pode ser uma crítica interna às realizações da União Europeia que se contraponha aos desígnios dos que a querem simplesmente destruir, sabe-se lá ao serviço de que interesses e fins.

A tentação que se abateu sobre a cabeça de António Costa para dramatizar as eleições europeias, não através da valorização de alguns temas comunitários sobre os quais os Portugueses deveriam estar mais avisados, mas antes através de questões de política nacional é bizarra mas tem algumas justificações. A primeira é seguramente a de minimizar os danos colaterais da escolha pouco ajuizada de Pedro Marques para liderar a lista de candidatos. Há quem o afirme pela falta de carisma de Pedro Marques. O argumento não me convence, pois se a escolha tivesse recaído em Maria Manuel Leitão Marques teríamos de pesar os mesmos argumentos. Foi uma má escolha pois, sabendo do que a casa das europeias em Portugal gasta, Pedro Marques personalizou o ministério com maiores problemas de concretização de investimento público, não por culpa do próprio, mas pela política orçamental de penalização do investimento público. Já Maria Manuel teria imenso material para apresentar. A segunda justificação tem que ver com a tentação de encostar o PSD às cordas na trajetória para as legislativas. Acredito mais na segunda justificação do que na primeira, com a grande vantagem de que a segunda é potencial uma solução de dois em um. Perturba a caminhada do PSD e ajuda a proteger o candidato.

Todos os planos usufruem por vezes de condições favoráveis não previstas. Não é vulgar mas acontece. Não se imaginaria, nem no pior dos cenários, que o PSD por via da questão do tempo de serviço dos professores acabasse por dar de mão beijada ao PS o impulso que precisava. Não é por acaso que as sondagens antes e depois da cena gaga do tempo de serviço dos professores têm resultados muito diferentes em termos de gap entre o PS e o PSD. Rio percorre com alguma penosidade a sua via-sacra de legitimação interna e externa e custa ver um político de boas intenções, honesto, a tatear um rumo, sujeito permanentemente às bicadas de quem queria ver no PSD o grande bastião da direita liberal (os mais consistentes não tenho disso dúvida) e dos que consideram que Rio nunca será um deles, ou seja, de uma certa corte que pensa que a distribuição dos QI dos portugueses diminui aceleradamente do centro lisboeta para as diferentes periferias. Não imagino quem seja o grupo mais restrito que discute ideias com Rio. David Justino tem-me surpreendido pela negativa, quando o considerava um político experimentado, sólido e, pelo menos do seu roteiro pessoal na educação, com uma cultura política que me inspirava confiança. Mas talvez haja outras luminárias, mas pelo que se tem visto, deve haver um problema sério de comunicação de ideias entre tal grupo e a liderança.

Esperaria mais do candidato Paulo Rangel. A opção tomada por um estilo “picadinho”, tornando o seu discurso irritante e de tão irritante um discurso muitas vezes vazio.

Num quadro de escolhas de largo espectro ideológico e partidário, o que torna indesculpável a decisão gratuita de não votar, com gente distinta mas robusta e coerente, como o são por exemplo Rui Tavares do Livre, Ricardo Arroja da Iniciativa Liberal e Paulo Sande do Aliança, e só neste trio há um mar de alternativas de visão da União Europeia, a minha relativa desilusão com a pré-campanha e campanha propriamente dita tem uma só razão. Para mim, a grande alternativa que deve ser discutida é esta: como discutir criticamente o aprofundamento da União Europeia numa perspetiva interna sem dar o flanco à sua destruição. Pois não me parece convincente defender o projeto europeu apenas com o peso da ameaça de que vem aí o Lobo. E neste campo o que é frustrante é a ausência de movimento no campo socialista europeu. Por isso, uma aliança entre socialistas e liberais para combater o Lobo sem que os primeiros se distanciem do seu contributo para o estado atual da União Europeia e reflitam num novo rumo parece-me precipitado passando por cima do verdadeiro problema.

Não sabemos ainda qual vai ser a real dimensão do voto na extrema-direita. Provavelmente será algo de intermédio entre o que a sondagem à boca das urnas na Holanda proporcionou (com vitória dos socialistas e emergência abaixo do esperado da nova estrela da extrema-direita holandesa) e os cenários mais aterradores em Itália, França e países do Leste Europeu. De qualquer modo, qualquer aliança no PE que tenha por objetivo barrar o caminho à extrema-direita não pode ignorar a necessidade de pensamento crítico dos rumos recentes da própria União. O autismo “prá frentex” de Macron carece de tradução política em diferentes países. Os sociais-democratas têm a sua própria casa ainda pouco robusta para negociarem. Por isso parece-me algo precipitada esta aproximação se não for devidamente trabalhada. Vejo uma possibilidade mais imediata, bloquear o acesso de Webber do PPE à Presidência da Comissão Europeia. O que já não seria pouca coisa.

Por cá, pediria uma baixa taxa de abstenção no plano comparativo europeu, a vitória do PS e se possível a eleição de Rui Tavares. Isso seria um excelente contributo de Portugal.

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