(Entre as tendências que atravessam a economia mundial e
que mais têm suscitado o debate entre os economistas integrados na evolução de
longo prazo das economias, a robotização e os seus efeitos sobre o emprego e o
estranho puzzle do fraco crescimento
da produtividade destacam-se claramente. Porém, só mais recentemente uma outra tendência tem
emergido na centralidade do debate. E até o World
Economic Outlook 2019 do FMI lhe dedica um capítulo.
É tempo de regressar aos temas económicos neste blogue.
Estamos num tempo em que cada vez mais é necessário separar bem a nossa
perceção da dinâmica das economias no curto prazo das tendências que condicionam
o seu crescimento no longo prazo. Trump vai certamente exacerbar a atenção
sobre a primeira daquelas dimensões porque lhe é favorável. A economia americana
vive um período de crescimento muito aceitável e a taxa de desemprego oscila praticamente
em função de um valor incompressível. Trump tem manifesto interesse em destacar
estas dimensões porque elas mascaram o impacto negativo das guerras comerciais
que precipitadamente tem acionado e o efeito da descida dos impostos sobre os
mais ricos já praticamente se esgotou.
Mas há economistas que não abdicam e bem de compreender as economias do
ponto de vista do tempo longo, reavivando a sua componente estrutural. Nesse âmbito,
duas dimensões têm ocupado a centralidade do debate: a robotização e os seus
efeitos sobre o emprego e o estranho puzzle das razões pelas quais, em ambiente
de progresso tecnológico intenso, a produtividade do trabalho teima em crescer
anemicamente. Embora obviamente relevantes, estes temas não podem fazer
esquecer outros sem os quais a compreensão da encruzilhada em que a economia
mundial e as economias mais maduras se encontram fica truncada.
Um desses fatores que passou por um certo esquecimento ou ocultamento é a
evidência de que o poder de mercado de algumas empresas tem crescido para além
dos limites do tolerável numa economia de mercado que se quer regulado. Esse
poder de mercado torna obsoletos todos os manuais e análises que teimam em relegar
a concorrência monopolista, os oligopólios e os monopólios para os últimos capítulos
em que geralmente a docência dos cursos de economia nunca chega ou quando chega
é para percorrer apressadamente como se fossem situações anómalas ou excêntricas.
Mas as consequências de esconder esses materiais para baixo da carpete como de
lixo se tratasse são nefastas em termos de compreensão do mundo económico
contemporâneo. Alias, por essa via ficam por explicar factos estilizados dos
nossos tempos como a queda persistente da quota do trabalho no produto (rendimento).
O mundo da determinação dos preços como se todas as empresas fossem irrelevantes
do ponto de vista da oferta de produtos e da procura de trabalho é um mundo
irreal, que relega para o plano da simples curiosidade a compreensão de variáveis
como são os preços de mark-up (com
fixação de uma margem) e o poder de mercado das empresas e suas consequências na
fixação dos preços e da taxa de salário.
A importância do tema é tal que o World
Economic Outlook 2019 do FMI (link aqui) lhe dedica um capítulo, mais propriamente o
segundo.
(World Economic Outlook, 2019)
A figura acima anuncia-nos uma economia global dual e desequilibrada. A
evolução das margens nos 10% de empresas mais ricas contrasta clarissimamente
com a evolução das mesmas margens nas restantes empresas. E a figura abaixo
mostra que esse é um essencialmente um problema das economias avançadas e não
das emergentes.
(World Economic Outlook, 2019)
As razões para este desconchavo de poder económico estão essencialmente na
desregulamentação que precedeu a crise financeira e provavelmente já não erá
apenas o regresso das políticas anti-trust,
à moda antiga, que poderão resolver o problema. Neste contexto, resolver o
problema da Europa como o pretendem Macron e Merkel com base no reforço da
concentração empresarial e no favorecimento de determinadas empresas do eixo
franco-alemão é atirar combustível para o fogo. Poderemos dar muitas voltas ao
quarteirão, mas a tributação com taxas que se vejam e não provoquem apenas cócegas
na rendibilidade empresarial parece incontornável. Até lá teremos de apoiar a
Comissária Margrethe Vestager. E entre um Webber de fraca reputação e a Comissária
para Presidente da Comissão Europeia a escolha parece óbvia.
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