(Ana Luísa Amaral)
(Este post esteve para ser publicado já há alguns dias, mas circunstâncias diversas, que não vêm agora aqui para o caso, foram diferindo a sua publicação. O texto surgiu-me na cabeça quando li o artigo da ex-ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, no jornal Público, (https://www.publico.pt/2021/06/05/culturaipsilon/opiniao/ana-luisa-amaral-falassemos-silenciamento-1965298) insurgindo-se contra a indiferença da comunicação social portuguesa relativamente ao prémio internacional recebido pela intelectual e literata Ana Luísa Amaral. Não sendo eu um amante fervoroso da poesia o que justifica então este post, que vê finalmente a luz da publicação?)
O argumento de Isabel Pires de Lima é irrefutável. O Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana, atribuído pelo Património Nacional Espanhol e pela Universidade de Salamanca, não é de facto um prémio qualquer que se desvalorize, não propriamente pelo seu valor pecuniário de 42.100 euros. A sociedade ibero-americana é vasta, o mercado bibliográfico ainda o é mais face à pequenez a que estamos habituados neste retângulo e suceder a Sophia de Mello Breyner Andresen, Nuno Júdice e João Cabral Neto honrará qualquer um com um mínimo de sensibilidade literária.
De facto, a reação da imprensa diária espanhola ao prémio de Ana Luísa Amaral foi comparativamente muito mais densa e interessante do que a observada em Portugal. Gostei especialmente do artigo de António Saez Delgado no El País, intitulado “El compromiso cívico de Ana Luísa Amaral” (link aqui). Não há dúvida de que os nossos valores de referência andam distorcidos pelos caminhos ínvios e contraditórios da mediatização e, embora a energia do Ronaldo continue a complicar-nos a vida, já deveríamos estar a fazer o desmame do nossso comportamento adictivo afce ao estímulo de termos ou não o “melhor do mundo”.
Só através de um trabalho recente para a Reitoria da Universidade do Porto e no contacto que tive com a Professora Fátima Vieira que se ocupa da política cultural da U. Porto é que me apercebi que a Ana Luísa Amaral tem origem na Faculdade de Letras do Porto e aí se doutorou.
Como já vos referi não sou propriamente um amante devoto da poesia, a minha biblioteca na matéria, quando comparada com o ensaio e o romance é uma gota num oceano e tenho de reconhecer que não tenho a memória (e já é tarde para a treinar nesse sentido) nem preparada nem rotinada para memorizar poesia e fazer aqui e ali um sainete recitando algo que me tenha impressionado.
Donde vem então o meu interesse pela obra e presença da Ana Luísa Amaral?
Devo confessar que o meu interesse vem da presença sempre sensível e arrebatada da autora na Antena 2, fazendo parceria com o Luís Caetano a quem a Antena 2 deve alguns programas de rara sensibilidade. Foi por aí que conheci a obra espantosa da Poetisa americana (ou Poeta, nunca sei) Emily Dickinson, como resultado do profundo conhecimento que a ensaísta e escritora tem sobre a poesia americana.
E quero sobretudo destacar o seu (e de Luís Caetano) mais recente programa quer tem aliás um título espantoso que só por si nos deixa pregados ao som do rádio ou da internet – O Som que os Versos Fazem ao Abrir (não é uma maravilha?
Ainda hoje, o programa sobre Alexandre O'Neill: 'Albertina' ou 'O Insecto-Insulto' ou 'O Quotidiano Recebido como Mosca' deu-me vontade de sair do carro e procurar uma biblioteca para reler a perversidade poética de O’ Neill (link aqui). E também há dias delirei com o programa sobre o poeta castelhano Vicente Aleixandre (Espanhol, 1898 - 1984. Nobel da Literatura em 1977) (link aqui).
A presença de Ana Luísa Amaral no programa equivale a um guia interpretativo de suporte a uma formação tardia em poesia. É um monumento de rádio que transforma o antes do almoço das quartas-feiras, de carro ou na internet, em momento raro de autoformação fora de tempo.
Os Espanhóis parecem ter percebido isto melhor do que nós próprios, devemos estar gratos por isso e que a Ibéria valorize a nossa poesia.
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