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(Ia eu, ontem pela manhã, a caminho não de Viseu mas de Lisboa para a sessão no CITEFORMA, ver post anterior, quando comecei a aperceber-me pelas notícias que vinham de Lisboa, com os meus netos retidos em casa sem Escola devido às inundações, que muito provavelmente iria ter uma viagem atribulada. O Alfa das 09.37 arrancou dentro dos limites, as vias em Alverca pareciam estar desimpedidas, mas um telefonema do CRL trouxe-me a notícia lá para as bandas de Espinho que a sessão iria ser anulada, dado o caos que se vivia nessa manhã em Lisboa. Compreensivelmente, saí em Aveiro para regressar à origem, tomei conhecimento que o Alfa de Lisboa para o Porto estava com um atraso previsto de cerca de duas horas, apanhei o suburbano Aveiro-Porto das 11.18 e fiz marcha atrás. Face à qualidade que efetivamente me surpreendeu do equipamento, tive tempo não só para confirmar o alagamento de parte do solo entre Aveiro e o Porto e também de pensar no caos de Lisboa, que as imagens televisivas visualizadas à hora do almoço em casa vieram adensar. Uma manhã diferente e isso na rotina do trabalho é sempre agradável de usufruir.)
O estimável Moedas, que o Ricardo Araújo Pereira admiravelmente tratou no seu último “É Gozar com quem Trabalha na SIC”, galvanizava-se em sucessivas intervenções televisivas, acenando com o alerta das mudanças climáticas para sensibilizar a população lisboeta e, simultaneamente, salvar o coiro de tão graves acontecimentos. Curiosamente, no concelho ao lado e perante a devastação em Algés, a velha raposa do Isaltino Morais adotava uma outra postura que consistia em proclamar o seu espanto perante a estranheza e violência do fenómeno mais natural que se conhece a chuva, provavelmente uma mensagem melhor recebida pela população do que invocar as costas largas das mudanças climáticas.
Pela noite televisiva, passavam entretanto especialistas que desmentiam o alerta de Moedas, salientando tratar-se de um fenómeno não diretamente ligado às tão apregoadas mudanças climáticas, com o sempre misterioso anti-ciclone dos Açores como principal suspeito.
Mas aquelas imagens cruelmente repetidas até à exaustão pelas televisões (é o que está a dar pois o dossier Ronaldo começa a perder-se no esquecimento dos bem-aventurados) deveriam suscitar um outro tipo de reflexão.
Em meu entender, o grau com que um dado território está em condições de acomodar ou domesticar a elevada concentração de pessoas, recursos e atividades representa sempre um limiar relativo, pois depende fortemente do que costumo designar de engenharia da qualidade e da gestão de infraestruturas. Nesta engenharia da qualidade devemos integrar a gestão e o ordenamento do território e, sem querer ser Velho do Restelo, o saudoso Arquiteto Ribeiro Telles já nos avisava nos anos 60 do rumo trágico que Lisboa estava a tomar.
É óbvio que os eventos climáticos extremos são uma preocupação para qualquer Cidade que se preze e Lisboa não será exceção. Mas o problema é que não temos e engenharia de qualidade e de gestão de infraestruturas capaz de acomodar a concentração em que a aglomeração de Lisboa se transformou. Por isso, lhe chamo o caos das externalidades negativas. Claro que a concentração lisboeta tem externalidades positivas, essencialmente associadas à concentração de recursos humanos superiores e avançados que acolhe. Mas, neste momento, a concentração populacional e de atividades tem uma carga de externalidades negativas que só uma engenharia de excelência poderia colmatar. Vinte anos para concretizar um plano de drenagem de águas pluviais é muito tempo com o agravante do contexto que o permitiu planificar já está substancialmente alterado com o incremento de concentração dispersa vivido na aglomeração metropolitana de Lisboa. Não por acaso Loures apareceu ontem em lugar de destaque.
O arranque da Grande Obra para março de 2023 não deixará de implicar, entretanto, a mitigação dos problemas de curto prazo não sanáveis até que a revolução estrutural esteja concluída. De qualquer modo, a monitorização das externalidades negativas da concentração desmedida não pode ser esquecida. O estimável Moedas tem de colocar a vermelho na sua Agenda o mês de Março de 2023 e entretanto começar, apoiando-se no conhecimento científico, a aprender a distinguir entre o que deve ser imputado às mudanças climáticas e o que pode ser assacado à gestão municipal e metropolitana.
Entretanto, não menos e até mais impressionantes são as imagens do Norte Alentejano (Campo Maior e Monforte), com uma devastação incomum para a imagem que temos do Alentejo. E aqui a natureza e os seus desmandos são cruéis para a pobreza. O Norte Alentejano é hoje a sub-região mais problemática do Alentejo. Uma devastação como a de ontem só torna mais problemático o que já é demasiado problemático. Toda a solidariedade nacional e regional é precisa para minimizar a devastação.
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