terça-feira, 23 de dezembro de 2014

A CIÊNCIA PORTUGUESA AVALIADA: PARTE II

(Miguel Manso, Jornal Público)


Como é do conhecimento geral a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) iniciou em 2014 os trabalhos de avaliação das estruturas de ciência em Portugal visando determinar a hierarquia dos financiamentos anuais de 2015 a 2020. O exercício foi realizado com o envolvimento da European Science Foundation de Estrasburgo, uma instituição acreditada nos e pelos meios da investigação científica, o que não é condição suficiente para que o exercício tenha sido realizado com um conhecimento profundo do universo muito diversificado de estruturas nacionais de ciência. Como é também conhecido, os resultados da primeira fase suscitaram enorme controvérsia, tendo afastado do processo cerca de 144 centros num universo de 322.
A segunda fase cujos resultados foram agora publicados destinava-se a hierarquizar de novo os 178 restantes, com foco especial no grupo dos que obteriam a nota de Excecional e de Excelente, para os quais está disponível a maior fatia dos recursos disponibilizados pelo Governo, a distribuir em função da massa de investigadores e da notoriedade científica obtida internacionalmente. Claro que a atribuição do estatuto de Excecional e de Excelente não resulta de um exercício puramente classificativo, porque foi conhecido que a FCT tinha à partida imposto quotas, destinando-se a avaliação a definir a permissão de entrada nessas quotas de financiamento.
Tem interesse percorrer os diferentes grupos classificativos em que a ciência portuguesa estruturada em centros passa a estar organizada.
Comecemos pelo topo da tabela, mais propriamente o grupo de 11 grupos classificados como excecionais. Todas as 11 unidades “excecionais” aparecem na pauta com uma pontuação máxima de 25. Anoto a relevante curiosidade de nesta lista inicial surgirem duas unidades de humanidades – o Institute for Comparative Literature (16 investigadores) da Faculdade de Letras da Universidade do Porto e o Centre for Comparative Studies (50 investigadores) da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Neste grupo as ciências sociais não estão representadas. As 9 excecionais restantes representam a ciência pura e dura: matemática (Center for Mathematics – Universidade de Coimbra com 67 investigadores; as ciências da vida e da saúde: Institute for Research and Innovation in Health Sciences da Universidade do Porto com 350 investigadores, que junta várias unidades de excelência da UP nesta área e a que preside o meu amigo Mário Barbosa, um cientista de pura água; o Champalimaud Neuroscience Programme sempre bem alinhado nestas classificações com 50 investigadores; o Institute Gulbenkian de Ciência com 96 investigadores; as engenharias: Institute of R&D in Structures and Construction da Faculdade de Engenharia do Porto  com 46 investigadores; as nanociências: Institute of Nanostructures, Nanomodelling and Nanofabrication da Universidade da conhecidíssima Elvira Fortunato com 25 investigadores e mais duas instituições, o Institute for Plasmas and Nuclear Fusions do Técnico e a Applied Molecular Biosciences Unit, uma rede. O Centro Interuniversidades de História da Ciência e da Tecnologia fecha o grupo.
Independentemente do mérito relativo, o universo das excecionais parece-me equilibrado e não tem o enviesamento para as ciências da vida que se esperaria. As humanidades estão presentes, ainda que as ciências sociais o não tenham conseguido. A Universidade do Porto está bem representada.
O universo das unidades excelentes é mais vasto e por isso mais complexo identificar as regularidades.
As ciências sociais estão agora presentes através da unidade de investigação da Universidade Católica da Professora Leonor Modesto, do Instituto de Ciências Sociais, do Centro de Investigação em Políticas do Ensino Superior do Pedro Teixeira agora Vice-Reitor da UP (bravo Hugo e outros investigadores), de grupos de sociologia e psicologia no Minho, no Porto e em Lisboa e da Unidade de Investigação sobre Governança, Competitividade e Políticas Públicas da Universidade de Aveiro liderado pelo Professor Eduardo Anselmo Castro que é o último da lista dos Excelentes.
Talvez o verdadeiramente apimentado venha para o fim. O Instituto de Ciências Sociais (Excelente) suplantou o CES de Boaventura Sousa Santos (Muito Bom). Maria Filomena Mónica deve rebolar-se de contentamento.
Uma nota final: a Faculdade de Economia do Porto colocou apenas um único centro (Muito Bom), muito distante dos critérios da excelência, neste caso o Center for Economics and Finance, dirigido pelo amigo António Almodovar. Numa altura em que a tragédia do poder ensandeceu uma grande parte dos professores da FEP, tragédia na qual a gente mais lúcida e o maior talento teima e bem não partilhar. Estes resultados deveriam ser causa suficiente para uma grande varridela nos destinos da FEP, acaso o talento e a lucidez tivessem capacidade de entendimento.

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