(Marion Fourcade)
Já aqui por várias vezes salientei o nome de
Marion Fourcade como uma das perspetivas mais aliciantes sobre o papel dos
economistas na sociedade e o modo como o seu pensamento influencia a decisão
política. É uma área de trabalho até há bem pouco tempo insuficientemente
reconhecida, mas os tempos atuais, em que a má influência de algum pensamento
económico sobre o mal-estar de uma parte significativa da população
designadamente europeia nos obriga a pensar por que razão as más ideias não são
substituídas por ideias menos lesivas das condições de vida das pessoas e da
igualdade entre as mesmas.
Marion Fourcade, socióloga de formação,
reparte-se pela Universidade de Berkeley na Califórnia e pelo Max Planck Sciences PO Center em Paris e
por isso estamos a falar não de uma voz qualquer, mas de alguém que pode ser
considerado incontornável na sociologia do pensamento económico e os
economistas precisam e não imaginam quanto de alguém que os veja de fora, ou
seja, liberto das amarras internas da profissão e das suas próprias hierarquias
e dependências.
Fourcade, juntamente com dois investigadores
franceses, Etienne Ollion e Yann Algan, acaba de publicar (novembro passado) um
curioso artigo nos Max Po Discussion Papers sobre
a superioridade dos economistas no universo das ciências sociais. A investigação
de suporte é ampla e diversificada e combina não apenas análise de temas hoje
agrupados nos chamados estudos de bibliometria (análise do que se publica e em
que condições), mas também perceções alimentadas pelos economistas em relação a
si próprios.
A investigação parte dos argumentos tradicionalmente
reportados à “superioridade” científica da económica, baseada no rigor formal
de alguns dos seus métodos analíticos, na maior intensidade de utilização da
matemática. Mas os elementos de investigação são mais vastos e integram aspetos
de uma maior insularidade da economia face às restantes ciências sociais (a
economia cita-se mais a ela própria e entre si e a sua relação com as outras ciências
sociais é desigual, ou seja, cita menos e é mais citada por essas disciplinas).
Integram também a maior propensão dos economistas para serem melhor remunerados
e destaca o papel dos MBA e da financialização da investigação económica para
explicar o seu maior peso junto de decisores políticos e do poder.
O trabalho de Fourcade e dos seus colegas conclui
que, talvez paradoxalmente, a maior proeminência dos economistas, construída através
de razões que estão hoje muito para além da pretensa superioridade científica
da economia face às restantes ciências sociais, é hoje a fonte da sua maior vulnerabilidade.
Nas sociedades democráticas, o poder não democrático dos especialistas tenderá
sempre a ser olhado de lado e nem sempre os economistas se apresentam com a
humildade necessária.
A palavra humildade não é acidental. Fourcade
recupera o parágrafo final dos Essays of Persuasion (1932) de John
Maynard Keynes, como não podia deixar de ser:
“Mas, mais do que
tudo, não permitam que sobreestimemos a importância do problema económico ou
que sacrifiquemos às suas supostas necessidades outras matérias de maior e mais
permanente significado. Deve ser uma matéria para especialistas, como são os
dentistas. Se os economistas fossem capazes de gerir o pensamento acerca de si
próprios como se fossem pessoas humildes e competentes como os dentistas, isso
seria esplêndido”.
Keynes lá sabia como interpretar os seus pares.
Sem comentários:
Enviar um comentário