quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

DESIGUALDADE E CRESCIMENTO ECONÓMICO



O êxito fulgurante da obra de Thomas Piketty, O capital no século XXI, colocou de novo o tema da desigualdade no debate económico, questão que o movimento Occupy Wall Street e a relação entre o 1º e os 99% da sociedade americana tinham trazido decisivamente para a rua, com réplicas sucessivas em diferentes movimentos de indignados.
É por isso natural que o debate teórico em torno do agravamento das desigualdades observadas nos últimos 30 anos das economias de mercado mais desenvolvidas e a sofisticação das evidências empíricas que têm vindo a ser produzidas tenham também experimentado um significativo impulso.
O que importa destacar aqui é que esse impulso alterou profundamente as relações de causalidade entre desigualdade e crescimento económico. Até este impulso recente, a abordagem central consistia em analisar os padrões de crescimento económico à luz do seu comportamento redistributivo: neutro (com os diferentes grupos de rendimento a revelarem crescimentos similares do mesmo), distributivo (com os mais pobres a ver o seu rendimento a crescer mais do que os mais ricos) e inequalitário (com o rendimento dos mais ricos a crescer mais do que o dos mais pobres). Nesta abordagem, foi possível recolher evidências de que o crescimento económico de alguns países asiáticos foi inesperadamente distributivo, em contraponto com o crescimento latino-americano que se orientou para uma crescente desigualdade.
Ora, nos tempos mais recentes, a relação entre crescimento e desigualdade inverteu-se, sendo possível demonstrar que a desigualdade não pode apenas constituir o resultado de certos padrões de crescimento económico, mas também e fundamentalmente que a desigualdade é inibidora do crescimento económico. Essa abordagem aproxima-se das teses de Piketty e da estagnação secular que têm sido avançadas para explicar o crescimento anémico da última década e a prospetiva pouco brilhante que se desenha para as economias de mercado no médio-prazo.
E o que é mais relevante é que essa abordagem tem sido fortemente alimentada por instituições internacionais como o FMI ou a OCDE, não satisfeitas com os padrões não distributivos do crescimento económico e com o efeito constrangedor do crescimento que provoca.
É o caso da OCDE em produção empírica muito recente. Um dos dados mais relevantes da investigação empírica da OCDE é ela concluir que o efeito negativo da desigualdade sobre o crescimento não é essencialmente determinado pelo comportamento dos 10% mais pobres, mas sim por um grupo mais alargado, os 40% mais pobres. E o efeito negativo materializa-se sobretudo pelo subinvestimento em educação que a desigualdade determina.
E por aqui chegamos a um dos meus argumentos centrais da crítica das políticas de ajustamento induzidas pela TROIKA. É o que chamei efeitos perversos dinâmicos da austeridade. Aqui está um deles. O agravamento da desigualdade penaliza dinamicamente o crescimento, designadamente através dos efeitos penalizadores sobre o investimento em educação pelas famílias.


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