segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

A MADEIRA NA TRANSIÇÃO POLÍTICA




Já por repetidas vezes neste espaço transmiti a ideia de que a minha área de trabalho exige o contacto com o terreno, incluindo entrevistas (o que parece estranho para um CEO da consultadoria, mas não é), sem o qual pensar o desenvolvimento territorial e local corre o risco de se tornar uma valente estopada e sobretudo de gerar ideias descontextualizadas, conduzindo regra geral à inutilidade de lombadas de relatórios perdidos algures numa estante ou arquivo.
Já também enunciei aqui a minha tese favorita de que a minha vivência de trabalho com a administração regional madeirense está para além de qualquer preconceito sobre o que se passa no universo das políticas públicas da região autónoma. A imagem que a truculência por vezes a roçar o boçal que Alberto João Jardim teimou em fazer passar nos últimos tempos não tem qualquer projeção na esmagadora maioria dos quadros regionais diligentes que tenho tido o prazer de contactar. Aliás, a personagem Jardim tem cambiantes difíceis de entender por parte do cidadão médio e indiferenciado, que tive pessoalmente a oportunidade de confirmar no estrangeiro, quando já há alguns anos (bastantes), nas minhas andanças de assessor da cooperação internacional da CCDR-N, verifiquei que o Alberto João das organizações internacionais não tinha nada que ver com o estereótipo que ele próprio criou para adornar o seu populismo e zurzir nas elites do continente.

Pessoa amiga, madeirense no continente, dizia-me há dias que tinha ficado espantado quando presenciou recentemente Alberto João em cerimónia pública a fazer questão de entregar pessoalmente um prémio qualquer de carreira empresarial a um elemento da família dos Blandy, família relativamente à qual a personalidade dedicava um ódio visceral, explicado por razões pessoais ou familiares profundas que não consegui ainda descortinar. O fait-divers de crónica social que o acontecimento representa anuncia a retirada de cena da personalidade, a qual não se tem coibido de deixar no ar interrogações, que são bem mais interrogativas do que o “vou continuar por aí” de Santana Lopes quando foi derrotado por Costa ou quando Sampaio lhe retirou o poder.
Estava por isso com curiosidade por sentir a administração regional em cenário potencial de transição política, não necessariamente partidária, mas antes de regime de liderança social-democrata, sobretudo a fazer fé que o diplomata e dandy Miguel Albuquerque, ex-presidente da Câmara Municipal do Funchal do qual conservo uma excelente impressão, consegue chegar à liderança apesar da presença na liça de alguns putativos delfins de Alberto João.
Pois a administração regional continua diligente, talvez na expectativa de que algo mude e que lhes retirem de cima o estereótipo do populismo, e sobretudo esperançada de que a austeridade seja erradicada e lhe permita regressar ao poder de compra de então.
Mas o Funchal ainda tem a marca da desmedida intervenção infraestrutural que o conceito de desenvolvimento de Alberto João impôs à Região, incluindo à própria Câmara Municipal do Funchal. As duas ribeiras que foram objeto das últimas e devastadoras inundações estão já intervencionadas no seu troço final e o impactante aterro que acumulou os detritos acumulados pelas derrocadas a montante deu lugar a uma intervenção de encher o olho em termos de passeio marítimo, que embelezava hoje no crepúsculo os dois cruzeiros de grande porte a recuperar forças para se fazerem ao mar. 

Num pequeno palco, mesmo em frente à Sé do Funchal, o grupo coral de jovens de Educação Artística de uma escola do Funchal fazia as delícias dos turistas e população local com um concerto de Natal bem animado e com apresentações aprimoradas em inglês, alemão e francês. O Jacquet continuava hoje fiel ao seu menu tipicamente madeirense, sem pão porque considera que o mesmo não permite ao cliente aprimorar o fruir sensorial do seu peixe fresco.
A cidade está calma e parece ignorar o risco da mudança política. Talvez no oculto das relações de poder algo se passe, não percetível ao visitante acidental.

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