quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

A PALAVRA A ROCARD

Michel Rocard (MR), hoje já com 84 anos, é uma grande figura da política francesa contemporânea. Apesar de MR ter sido várias vezes ministro e até primeiro-ministro durante três anos, entre outras funções públicas relevantes (incluindo as de primeiro secretário do PSF, eurodeputado e embaixador), a sua carreira ficou um tanto aquém do que generalizadamente lhe chegou a ser profetizado e do que legitimamente terá chegado a ambicionar. Isto é, e para ir direto ao assunto, MR não logrou ser Presidente da República.

Tempos houve em que os resquícios do nosso referencial predominantemente francês levaram muitos analistas a assimilar, quiçá com alguma propriedade, a dupla Mitterrand-Rocard à lusitana dupla Soares-Sampaio. Mas a evolução dos factos desmentiu a real justeza dessa assimilação, designadamente na medida em que – razões e méritos à parte – nunca foram efetivamente sanados os desencontros entre Mitterrand e o ex-esquerdista Rocard (PSU), ao contrário do que ocorreu com as diferenças entre Soares e o ex-esquerdista Sampaio (MES) que aliás lhe sucedeu.

Sigo adiante para explicitar ao que venho e tal tem sobretudo a ver com a continuada presença pública de MR, num quadro aliás marcado pelas suas elevadas qualidade intelectual e experiência política. O seu mais recente artigo, que publicou no “Le Monde” com vista a defender veementemente a manutenção do nome do Partido Socialista, aflora três pontos substanciais, que de seguida quereria referenciar (sublinhados meus).

(André Lebon, http://www.ebay.fr)

O primeiro tópico corresponde a um lamento e a uma denúncia associados ao que designa por “desaparecimento do tempo longo”, situação que explicita através do modo como o nosso “raciocínio” vai sendo empurrado para uma centralidade do instantâneo e para uma recusa do complexo.


O segundo tópico corresponde à afirmação de uma firme convicção reformista assente no primado de uma visão, numa lógica de incessante procura de consensos e no pleno reconhecimento metodológico da progressividade na emergência dos elementos definidores de uma nova sociedade.


O terceiro tópico corresponde a um descomplexado regresso às origens marxistas, com referência explícita ao próprio e tão diabolizado “pai fundador” e algum desculpável revisionismo à mistura, numa espécie de nova versão da 11ª tese sobre Feuerbach em que à defesa da praxis com que Marx contrapõe a transformação do mundo às suas diversas interpretações pelos filósofos junta o caráter ativo e consciente associado à essencialidade do esforço humano no sentido da compreensão profunda do funcionamento dos cada vez mais complexos mecanismos que se pretendem modificar/destruir.

Reflexões avisadas e judiciosas de um homem que tanto andou por aí e não para de deixar marcas indeléveis de um pensamento distintivo...

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