Falo por experiência própria. A minha vida de docência
universitária decorreu total e exclusivamente na Faculdade em que me licenciei,
com a experiência pontual de, no quadro da cooperação da Faculdade de Economia
do Porto com outras Escolas, ter lecionado alguns (poucos) anos quer na
Faculdade de Letras do Porto, quer no Centro Regional do Porto da Universidade Católica,
mas sem ter tempo para partilhar o dito ambiente universitário dessas Escolas. Sempre
achei, contra a minha própria experiência, que essa tendência para uma trajetória
sem saltos organizacionais de Escola para Escola equivalia a uma perspetiva
demasiado protecionista da vida universitária, sem estímulos à diversidade e
sobretudo fracamente geradora de inovação de programas curriculares e de sangue
fresco no fluxo de investigação e de culturas organizacionais. Na minha visão
do problema da Universidade e Politécnicos em Portugal são os défices
organizacionais que mais bloqueiam o salto para a modernidade que ainda
dominantemente não foi dado.
De acordo com a informação que estava então disponível,
a perceção sobre o problema era meramente intuitiva, sem evidências seguras em
termos quantitativos. Algumas evidências emergiam com os resultados dos
concursos que as diferentes Escolas abriam para preenchimento dos seus quadros
e progressão na carreira académica dos seus principais expoentes humanos, com
largo predomínio desta última componente e, de vez em quando, com alguns “escândalos”
de candidaturas exteriores a uma Escola que ganhavam o concurso e Aqui d’El-
Rei, mosquitos por cordas por tão insolente mudança e não respeito da tradição.
Embora afastado das lides, creio que a ausência
dessa informação continua viva, embora haja ecos de que sobretudo com a chegada
ao país de professores-investigadores sem vínculo a qualquer Escola possa haver
alguma renovação de entradas exógenas.
O tema surgiu na minha reflexão porque o El País publica hoje na sua edição on-line
pela primeira vez resultados da situação universitária espanhola nesta matéria,
à qual o jornal dedica a bela expressão da endogamia universitária. Segundo o
jornal, 73% dos docentes espanhóis concretizaram integralmente a sua carreira
dentro dos muros da Escola em que iniciaram a sua formação universitária. O
estudo de base destas novas evidências salienta a relação de forte causalidade
que existe entre a endogamia e a baixa produtividade da Universidade espanhola,
sobretudo quando comparada com a elevada capacidade de atração de professores e
investigadores externos por parte das Universidades que lideram os diferentes rankings
internacionais que se vão construindo por esse mundo fora em função de
diferentes critérios.
O estudo refere ainda situações menos limpas
nesse protecionismo endogâmico, de claríssima discriminação positiva dos de
dentro em relação aos de fora.
O que me interessa destacar nos números de
Espanha é que a endogamia é também fruto essencialmente da baixa capacidade de
atração de talentos que as universidades do sul (em que as portuguesas estão
inseridas) revelam face às congéneres que lideram o mundo do conhecimento. O
que é particularmente gravoso. A divergência é o destino inevitável dessa
diferença e o que é mais grave é que, ao induzir a endogamia e com ela a baixa
produtividade, a divergência é cumulativa e irrecuperável no tempo.
No fundo, bem lá no fundo, vizinhos por vezes tão
diferentes, mas também tão parecidos nos seus problemas estruturais.
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