segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

ENDOGAMIA UNIVERSITÁRIA



Falo por experiência própria. A minha vida de docência universitária decorreu total e exclusivamente na Faculdade em que me licenciei, com a experiência pontual de, no quadro da cooperação da Faculdade de Economia do Porto com outras Escolas, ter lecionado alguns (poucos) anos quer na Faculdade de Letras do Porto, quer no Centro Regional do Porto da Universidade Católica, mas sem ter tempo para partilhar o dito ambiente universitário dessas Escolas. Sempre achei, contra a minha própria experiência, que essa tendência para uma trajetória sem saltos organizacionais de Escola para Escola equivalia a uma perspetiva demasiado protecionista da vida universitária, sem estímulos à diversidade e sobretudo fracamente geradora de inovação de programas curriculares e de sangue fresco no fluxo de investigação e de culturas organizacionais. Na minha visão do problema da Universidade e Politécnicos em Portugal são os défices organizacionais que mais bloqueiam o salto para a modernidade que ainda dominantemente não foi dado.
De acordo com a informação que estava então disponível, a perceção sobre o problema era meramente intuitiva, sem evidências seguras em termos quantitativos. Algumas evidências emergiam com os resultados dos concursos que as diferentes Escolas abriam para preenchimento dos seus quadros e progressão na carreira académica dos seus principais expoentes humanos, com largo predomínio desta última componente e, de vez em quando, com alguns “escândalos” de candidaturas exteriores a uma Escola que ganhavam o concurso e Aqui d’El- Rei, mosquitos por cordas por tão insolente mudança e não respeito da tradição.
Embora afastado das lides, creio que a ausência dessa informação continua viva, embora haja ecos de que sobretudo com a chegada ao país de professores-investigadores sem vínculo a qualquer Escola possa haver alguma renovação de entradas exógenas.
O tema surgiu na minha reflexão porque o El País publica hoje na sua edição on-line pela primeira vez resultados da situação universitária espanhola nesta matéria, à qual o jornal dedica a bela expressão da endogamia universitária. Segundo o jornal, 73% dos docentes espanhóis concretizaram integralmente a sua carreira dentro dos muros da Escola em que iniciaram a sua formação universitária. O estudo de base destas novas evidências salienta a relação de forte causalidade que existe entre a endogamia e a baixa produtividade da Universidade espanhola, sobretudo quando comparada com a elevada capacidade de atração de professores e investigadores externos por parte das Universidades que lideram os diferentes rankings internacionais que se vão construindo por esse mundo fora em função de diferentes critérios.
O estudo refere ainda situações menos limpas nesse protecionismo endogâmico, de claríssima discriminação positiva dos de dentro em relação aos de fora.
O que me interessa destacar nos números de Espanha é que a endogamia é também fruto essencialmente da baixa capacidade de atração de talentos que as universidades do sul (em que as portuguesas estão inseridas) revelam face às congéneres que lideram o mundo do conhecimento. O que é particularmente gravoso. A divergência é o destino inevitável dessa diferença e o que é mais grave é que, ao induzir a endogamia e com ela a baixa produtividade, a divergência é cumulativa e irrecuperável no tempo.
No fundo, bem lá no fundo, vizinhos por vezes tão diferentes, mas também tão parecidos nos seus problemas estruturais.

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