quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

O CENTRÃO GERMÂNICO




(Há uma paleta de interpretações para todos os gostos acerca do acordo de governação entre Merkel (CDU), a CSU e o SPD de Schultz, que requer ratificação por parte das bases do SPD.)

Mais do que quatro meses foram necessários para se conseguir um acordo de governo na Alemanha, isto no pressuposto de que, com maior ou menor resistência e crítica, as bases do SPD acabarão por validar o alcançado em duras e complexas negociações. Se é verdade que Schultz jogou forte para fazer apagar a imagem sombria da última coligação, cujo retorno eleitoral para o SPD foi precário, também não é menos verdade que a ameaça da extrema-direita alemã, hoje representada no Parlamento, e futura protagonista da oposição ao presumível governo, pairou sobre toda a negociação, impondo resultados de concretização.

Não tive ainda acesso ao texto de muitas páginas que enquadra o acordo. Dos últimos elementos tornados públicos em termos de posicionamento das três forças políticas (tendo em conta que CDU e CSU podem ser considerados forças políticas com diferente ideário e sobretudo diferente incidência territorial) resultam algumas ideias que, apesar de escassas, chegam para suscitar uma paleta diversificada de interpretações (ver aqui um breve resumo do Financial Times).

Do ponto de vista das futuras responsabilidades ministeriais, a “conquista” pelo SPD das Finanças e da diplomacia externa (que o próprio Schultz assumirá abandonando a liderança do SPD) pode ser lida como uma grande conquista. Mas também pode ser interpretada como uma habilidade negocial de Merkel, amarrando os dois ministérios a acordos bem definidos, forçando o SPD a comprometer-se com áreas mais críticas e cortando cerce a sua margem de manobra de recuo caso as coisas possam correr mal. É que o futuro ministro das Finanças, embora possa trazer para a política europeia um estilo bem diferente do de Schäuble, continua amarrado a uma lógica de orçamento equilibrado e não expansionista. O método utilizado é aplicar o excedente orçamental em programas sociais, mas mantendo o compromisso do equilíbrio orçamental.

Há também quem veja na negociação o canto do cisne (da pata) de uma Merkel em fim de ciclo político. O chiste de que “vá lá a CDU conseguiu manter a chancelaria” é elucidativo do ambiente suscitado pela longa negociação. E a bávara CSU, para além do ministério dos Transportes que continua a liderar, foi presenteada com um ministério do Interior alargado, a partir do qual poderá controlar a supervisão da imigração. Schultz comprometeu-se com metas mais apertadas de abertura à imigração, contrapartida necessária para o avanço das suas próprias propostas.

Reina entretanto entre os observadores algum otimismo quanto ao que a nova coligação pode significar em matéria de participação no processo de conserto das instituições europeias. Mas Schultz conseguiu colocar na letra do acordo a questão do Fundo Monetário Europeu. Continuo a pensar que a articulação entre a França de Macron e a Alemanha da nova coligação estará mais interrogada e não sabemos de que modo essa eventual aproximação contribuirá para um reposicionamento dos restantes países. Pelo menos, uma maior atenção a algumas experimentações e derivas salientes por terras do Visogrado (Eslováquia, Hungria e Polónia) será necessária.

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