O INE publicou recentemente o seu “Estudo sobre o Poder de Compra Concelhio 2017” e ele é mais um elemento de inequívoca confirmação quanto às desigualdades que marcam o nosso País. Mesmo sabendo-se que há quem tenha reservas sobre a metodologia e as escolhas substantivas e técnicas subjacentes a este trabalho que o INE já desenvolve de há muito, julgo que vale a pena chamar a atenção para alguns resultados sem prejuízo de sugerir aos interessados uma leitura mais aprofundada do documento e dos respetivos dados.
Vejamos, então:
· o gráfico de abertura deste post, posicionando-se a nível de NUTS II, ilustra o valor comparativo do indicador principal – o indicador de poder de compra per capita – e permite sem grandes dúvidas concluir que vivemos num Portugal de Lisboa versus o resto (a Área Metropolitana de Lisboa apresenta-se quase 25% acima da média nacional, enquanto todas as outras regiões ficam abaixo dessa mesma média, com o Algarve muito próximo desta e as demais cinco a situarem-se num intervalo que vai dos 86,5% da Madeira aos 92,1% do Norte);
· os 308 municípios revelam igualmente um elevado grau de desigualdade entre si, com o de Lisboa a ser o único a apresentar um indicador superior ao dobro da média nacional (quase 20 pontos percentuais acima) e apenas 32 a ficarem acima dos 100% (sendo 7 de uma Região Norte com 86 municípios, a saber e por ordem decrescente de lugar no ranking: Porto, São João da Madeira, Matosinhos, Maia, Braga, Espinho e Vila Nova de Gaia);
· do mesmo modo, os piores indicadores (valores abaixo dos 60%) encontram-se em 17 municípios, 11 dos quais a Norte: Tabuaço (Douro), Celorico de Basto (Tâmega e Sousa), Cinfães (Tâmega e Sousa), Vinhais (Terras de Trás-os-Montes), Baião (Tâmega e Sousa), Santa Marta de Penaguião (Douro), Sernancelhe (Douro), Boticas (Alto Tâmega), Valpaços (Alto Tâmega), Resende (Tâmega e Sousa) e Mondim de Basto (Ave);
· complementando este último apontamento em relação aos casos municipais de maior pobreza, retenhamos agora um corte abaixo de 75% da média nacional e constatemos que passa a 148 (pouco menos de 50% do total) o número de municípios incluídos (48 a Norte, i.e., pouco menos de um terço do total desta amostra mais pobre e 55,8% dos municípios pertencentes à Região);
· continuando a focar mais a Norte, será ainda de sublinhar que os valores de poder de compra de maior significância relativa (acima dos 90%) se situam em 15 municípios (além dos sete acima referidos como detendo um indicador superior a 100%, temos então: Vila Real, Bragança, Vila do Conde, Póvoa de Varzim, Viana do Castelo, Trofa, Valongo e Guimarães);
· quanto aos municípios mais ricos, e para além do já mencionado outlier lisboeta e dos sete nortenhos, registem-se os 24 em causa por ordem classificativa decrescente: Oeiras (AML), Faro (Algarve), Sines (Alentejo), Coimbra (Centro), Aveiro (Centro), Cascais (AML), Alcochete (AML), Évora (Alentejo), Funchal (Madeira), Albufeira (Algarve), Almada (AML), Ponta Delgada (Açores), Setúbal (AML), Azambuja (Alentejo), Loulé (Algarve), Beja (Alentejo), Portalegre (Alentejo), Portimão (Algarve), Leiria (Centro), Sobral de Monte Agraço (Centro), Castro Verde (Alentejo), Santarém (Alentejo), Amadora (AML) e Barreiro (AML);
· por último, e não pretendendo adensar em demasia estas breves notas, uma evidência mais: dos 18 municípios integrantes da AML, 8 já referidos estão acima da média e os restantes 10 têm como patinho feio a Moita (81,95), já distantemente seguida por Odivelas (89,30) e Seixal (89,69), enquanto todos os restantes aparecem acima dos 90%, alguns bem próximos da média nacional (Montijo, Vila Franca de Xira e Palmela, especialmente).
Deixo a pergunta que se me impõe, repetitiva mas sempre ajustada: será isto um fado que esta nossa democracia se continuará a recusar encarar em nome da chamada unidade nacional?
(Hugo Pinto, https://expresso.pt)
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