(O caldeirão do BREXIT
continua em desregrada ebulição, só não sendo ainda claro quem será o João
Ratão que nele cairá. As eleições gerais que se aproximam trazem-nos uma
realidade que para nós é uma fantasia, mas que na situação atual em que os
britânicos se encontram será decisiva, merecendo por isso acompanhamento atento
neste blogue.)
As piruetas sofisticadas a que o “jongleur” Boris nos tem habituado conseguiram algo de espantoso,
que há poucas semanas acharíamos, e com razão, inverosímil. O primeiro-Ministro
não eleito Johnson conseguiu um acordo que equivale na prática ao que Theresa
May considerou inaceitável para qualquer primeiro-Ministro no Reino Unido. Na
prática, corresponde à primeira proposta da União Europeia. No fim de contas, o
tão discutido “back stop” acabou por
se transformar no acordo aceite por Johnson, com a Irlanda do Norte a manter-se
na união aduaneira e no mercado único. Tudo isto não parece rocambolesco, é
efetivamente rocambolesco. Podemos interpretar esta guinada de Boris Johnson
como o resultado da perceção de que em ambiente de eleições gerais, a questão
Irlanda do Norte pouco contará e que não interferirá no seu objetivo último de
tentar ganhar as eleições gerais e ganhar com isso fôlego e poder negocial para
os arranjos finais com a União Europeia. Os representantes desta última não
esconderam obviamente a sua satisfação pela recetividade de última hora de Boris
Johnson ao prescrito para a Irlanda do Norte.
Confusos? Eu também e tenho lido muita coisa sobre o
assunto.
A realização de eleições gerais em pleno processo de
prolongamento do pedido de saída da União Europeia vem baralhar e de que
maneira a antecipação de resultados. A razão está muito para além dos
resultados da sondagem de 23 de outubro que abre este post. Olhando para esses resultados, aparentemente os Conservadores
teriam a vitória assegurada, na sequência de ganhos eleitorais recentes e das
perdas que o Labour vem apresentando para os LIB DEM. Mas o problema é que as
eleições gerais vão ser atravessadas pela clivagem entre o REMAIN e o LEAVE e não
é só a existência de um partido dos BREXITERS mais duro que irá complicar a
situação. Por exemplo, entre as hostes do Labour, há entre as populações mais
jovens, mais urbanas e qualificadas um predomínio dos REMAINERS. Em
contrapartida, entre o Labour mais velho e da “pesada” o LEAVE predomina. O
mesmo poderá dizer-se dos Conservadores que são também atravessados por essa
clivagem. O LIB DEM parece ser o menos impactado por esse conflito. No sistema
eleitoral britânico, em que o lugar no Parlamento é conquistado em cada
circunscrição pela vitória do candidato mais votado nem que seja por mais um
voto apenas, compreende-se que o voto tático pode baralhar totalmente
resultados. Se o pensamento dominante for não o de promover uma dada formação
política mas votar em função do confronto entre o LEAVE e o REMAIN poderemos
assistir a resultados surpreendentes. Isso pode favorecer o LIB DEM mas não é
seguro.
Mas há uma moral em torno de toda esta bagunça que uns
iluminados saudosos do poder imperial britânico têm vindo a provocar num
posicionamento de negação que ficará para a história democrática do Reino Unido
como uma estupidez monstruosa. A moral é simples: não se pode remediar o
resultado de um referendo precipitado com eleições gerais.
Aqueles que pensavam que o exemplo britânico do BREXIT era
o que a crítica às instituições e diretórios europeus necessitava como exemplo
de prática correta ainda pensarão dessa maneira? Em caso afirmativo, também
eles estarão em puro estado de negação. Que fiquem bem.
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