quarta-feira, 20 de novembro de 2019

ZÉ MÁRIO BRANCO


Tinha pensado ficar-me por aquela referência singela a José Mário Branco que consta do primeiro parágrafo do meu último post. Mas acordei com o “Tubo de Ensaio” (TSF) do Bruno Nogueira (BN) e acedi depois ao notável destaque que lhe é dado nas páginas do “Público” de hoje, razões mais que bastantes para uma insistência no triste assunto. Faço-o com a devida vénia ao BN, citando a sua excelente homenagem ao Zé Mário e a muito do que ele representou e nos legou. Que rezou como segue.

“Olá pessoas! Morreu José Mário Branco. Já todos sabem, ainda que muitos não saibam de quem estamos a falar. Estamos a falar de um homem que – com é que eu vos hei de explicar? – tina uma espinha de aço, uns testículos de betão e um coração maior do que a obra, o que neste caso não é fácil. Para muitos, José Mário Branco é de imediato associado à música ‘FMI’ que, na prática, é um standup muito atual sobre o FMI, o capitalismo e o nosso Portugal. A letra é tão atual que podia ser feita amanhã. No fundo, José Mário Branco está para o FMI como antónimo da Maria Luís Albuquerque – querer que se foda o FMI, é muito diferente de querer fazer amor com o FMI ou querer andar ao colo do alemão que andava de cadeira de rodas. Ouçam toda a letra de ‘FMI’ porque está lá tudo, tudo o que somos, de que não nos livramos mas de que fingimos que somos livres. Foi preso pela PIDE – aquela polícia de um regime que não era fascista e que até merece um museu em homenagem –, poucas pessoas conseguiram escrever e visualizar o que é a hipocrisia deste país com humor e dor – uma espécie de revolta sensível –, recusou receber as condecorações oferecidas pelo Presidente da República – as mesmas que receberam Armando Vara, Zeinal Bava, Dias Loureiro e outros tantos portugueses de enorme mérito que foram a correr receber o colar do Presidente; é extraordinário como depois de ele ter recusado ser condecorado enquanto vivo, ainda seja posta a hipótese de o condecorar agora – o Presidente disse que seria uma decisão da família, eu penso que a seguir vão querer cortar-lhe o bigode, o Presidente deve querer condecorá-lo porque ele agora não pode dizer que não, nem sequer pode gritar ai se ele o picar com a medalha –, acho que é um risco que o Presidente não devia correr – o Zé Mário é rapaz para regressar dos mortos só para lhe dar uma cabeçada. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, mas esta vontade do Zé Mário Branco é para respeitar além dos tempos. Faz falta essa inquietação, o sair do rebanho, dar marradas nas outras ovelhas e morder o cão de guarda, ser a ovelha negra das outras ovelhas tão brancas e tão puras que só assim balem todas ao mesmo ritmo; não é a ovelha que é negra, são as outras que se acham alvas e alvos fáceis para que tudo fique como está. Portugal precisava de um José Mário Branco em cada esquina, mais do que nunca. É uma tristeza termos perdido um homem destes mas ele nunca se perdeu nem nunca se vai perder, portanto é enxugar as lágrimas e sorrir porque, como ele dizia, ‘quero ser feliz, porra!, quero ser feliz agora’. Beijos. E, já agora, fiquem com o Zé Mário p’ra sempre.”

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