domingo, 3 de abril de 2022

REVISITANDO OS CHOQUES PETROLÍFEROS

A idade também tem destas coisas, lembrarmo-nos de longínquas matérias do passado e dos respetivos contextos. Tal é o caso do simbólico primeiro choque petrolífero à escala internacional, ocorrido em 1973 quando ainda vivíamos sob a ditadura do Estado Novo. Para mim, o tema existiu no seu tempo ― afinal já andava pelos corredores da FEP! ― mas só acabou por ser especialmente interessante aquando da reflexão em torno que pude acompanhar de perto uns anos mais tarde no quadro do CEPII (e junto de outras instâncias de investigação e intelectuais da época) durante os meus anos de Paris (1980-1984), desembocando a mesma nos precursores estudos de 1983 e 1984 (respetivamente, “Économie mondiale: la montée des tensions” e “Économie mondiale 1980-1990: la fracture?”, este já mais eminentemente prospetivo) sobre as grandes questões da economia mundial, seja no tocante à escalada de ruturas que sobre ela se começou a abater desde finais dos anos 60 e no decurso dos anos 70 (monetárias, primeiro; energéticas, em seguida; industriais e relativas à qualidade da especialização internacional das economias, depois) ou no tocante ao que então poderia estar diante de nós num tempo em que o comando económico era americano e japonês e em que a Europa (já assim se dizia à época) jogava o seu destino.

 

Quase cinquenta anos depois do dito choque, constata-se que foi imensa a sucessão de factos traduzíveis em termos da ideia-chapéu de choque petrolífero (embora a realidade os tenha maioritariamente ligado a episódios de crise económica aguda de vária natureza e menos a razões associadas aos produtores e suas escolhas cartelizadas ou políticas ou a divergências e conflitos bélicos agudos), como se observa no quadro acima. Mas o mais chamativo é percebermos a diferente expressão de todos estes incidentes em termos do curso do brent, com as primeiras manifestações e as de final do século XX a revelarem-se bastante pouco marcantes em termos nominais quando comparadas com as mais recentes (em contraste com uma comparação em termos reais em que o segundo choque petrolífero ganha particular significância); neste quadro, e como o quadro abaixo bem ilustra, a presente guerra da Ucrânia já foi içada a um nível de relevância muito saliente (apesar de ainda algo longínquo do atingido na crise financeira de 2008). Recordar é viver, inclusivamente quando apenas afloramos enquadramentos que nos marcaram e condicionaram.


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