A evolução dos acontecimentos em curso na Ucrânia, apesar da brutal e gratuita destruição no terreno que vamos observando, corresponde também a um importante volume de perspetivas furadas por parte do invasor russo.
As sanções (e já perdi a conta ao número de pacotes decididos...), diga-se o que se disser sobre a sua limitada eficácia, têm produzido golpes importantes na economia do país (vejam-se, por exemplo, as estimativas de forte crescimento negativo que existem para 2022) e atingiram com algum impacto muitos elementos da nomenclatura próxima de Putin (esperando-se um crescendo de mal-estar nestes oligarcas habituados a manobrar com grande impunidade no seio da Europa democrática).
E a guerra propriamente dita tem causado enormes estragos nas hostes russas (algumas muito marcantes por corresponderem ao desaparecimento de alguns titulares de patentes relevantes das forças armadas, gente de confiança, portanto), independentemente do ruído comunicacional que vai naturalmente dominando como parte do jogo bélico (incluindo também, ao que se vai sabendo, relatórios noticiosamente falsificados por adocicação da parte de vários responsáveis pela ação no terreno); o que já parece ter delimitado o alcance das pretensões putinianas, com a retirada de tropas de algumas zonas, e não deixará de provocar alguns abalos na moral dos combatentes e da população em geral.
Aqui chegados com esta síntese de boas notícias, resta acrescentar o pior em termos de expectativas para o futuro imediato: a muito provável incapacidade europeia para provocar junto de Putin um golpe que pudesse ser fatal mas que não acontecerá por via de um misto de dois problemas dificilmente contornáveis: a dependência energética gigantesca de alguns países (Alemanha à cabeça), o que os impede de votar medidas sancionatórias definitivas na matéria, e uma desunião interna que tem sido disfarçada mas recomeça a emergir (veja-se o caso húngaro, sobretudo após o reforço do peso de Orbán na sequência da vitória eleitoral que logrou), entre diferenças substantivas de alinhamento externo e algumas agudizações de conflitos internos em torno da rule of law.
Sendo que, em bom rigor, deveríamos também referir tudo quanto vai ficando escondido por debaixo das medidas sancionatórias tomadas pelo Ocidente, como ontem tão bem denunciou Guy Verhofstadt no Parlamento Europeu ao afirmar exuberantemente que a “estratégia de sanções incrementais não funciona” e ao clamar junto de Borrell por uma mudança, que não tem condições para acontecer, para uma lógica de full sanctions.
E, entretanto, a guerra continua e o sofrimento com ela...
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