(De novo por terras da Mêda, Vila Nova de Foz Coa, Figueira de Castelo Rodrigo e proximidades, em convívio com Amigos com casa em Vale Flor, tive ontem a feliz oportunidade de visitar as gravuras do Coa à noite, com início ainda o sol vertia os seus últimos raios sobre a mítica Quinta da Erva Moira. A entrada faz-se por Castelo Melhor, Penescosa, com encontro no Centro de Receção das Gravuras e tivemos um guia o Marco Ferraz, muito simpático, competente e um excelente comunicador, um agente de desenvolvimento à antiga, instalado na região desde 2011 como Guia de Natureza e Educador Ambiental com certificação e promotor da AMBIEDUCA.)
A AMBIEDUCA (link aqui) é, segundo o sítio web do Marco, uma marca registada em 2009 “para dinamizar atividades de Educação Ambiental e Animação Turística para aproximar pequenos e graúdos da Natureza e estimular práticas de vida saudáveis e sustentáveis”. Estamos perante uma trajetória de agente de desenvolvimento que tenho encontrado algumas vezes nas minhas atividades, hoje já mais esparsas, de andarilho do planeamento do desenvolvimento. A educação para a sensibilidade ambiental cruza-se com uma filosofia de vida que preza o contacto com a natureza e que pretende em primeiro lugar proporcionar aos seus filhos uma outra perspetiva da ruralidade e das valias da natureza. A atividade de guia certificado de visita das gravuras assegura essa entrada já que com as gravuras é possível realizar espécie de viagem no tempo (palavras do Marco na visita) e tomar contacto com toda a cultura, organização produtiva e memórias de abandono daquele território singular.
Antes de falar das gravuras é importante falar do perfil do Marco pois ele corresponde a uma mobilidade no território continental que não é muito comum: é nativo de Ourém, licenciou-se em Engenharia Biológica na Universidade do Algarve, viveu no Porto uns tempos e está hoje instalado num pequeno povoado Vilar de Amargos próximo de Figueira de Castelo Rodrigo. A trajetória segue com um pequeno projeto de turismo em espaço rural no povoado, já em funcionamento, e através de uma associação de desenvolvimento local prolonga-se no reaproveitamento de uma Escola hoje sem alunos para um hostel para 12 pessoas. Um projeto de cooperação com estudantes das Belas Artes no Porto iniciará em breve uma iniciativa de residências artísticas através das quais os estudantes são desafiados a reinventar usos para materiais tradicionais da zona como, por exemplo, a lã das ovelhas.
Curiosidade das curiosidades, e como o mundo é pequeno, foi em Vilar de Amargos que a Amiga e artista Ana Fernandes fez a sua exposição dos Lagartos que esteve uns tempos pelo Espaço Mira no Porto.
Mas voltemos às gravuras e à sua perspetiva noturna.
A minha relação com as gravuras vem dos tempos em que ainda exercia atividades de consultor na CCDR Norte. Tinha-as visitado em trabalho mas nunca beneficiara da sua visita à noite, depois de assistirmos ao desaparecer do sol com a Erva Moira pela frente. E, de facto, sob o holofote diligentemente transportado pelo Marco é uma perspetiva totalmente diferente que se forma, com os dois estilos de inscrição e representação bem identificados nos painéis que a visita permite analisar. O trabalho interpretativo que continua a ser desenvolvido pela comunidade de arqueólogos não tem fim e creio que novas perspetivas de leitura virão nos próximos tempos para bem justificar a audaciosa decisão política de se interromper a construção de uma barragem para salvaguarda deste valioso elemento patrimonial da humanidade.
A visita concretiza-se através de um percurso de acesso restrito, que entretanto deixa de ter guarda vigilante do Parque creio que depois das 19 ou 19.30. A partir dessa altura são os guias certificados como o Marco que passam eles próprios a assumir a função de vigilantes. Já em plena visita guiada com a noite já caída, um ciclista montanheiro espanhol procurava não autorizadamente um percurso para o fazer chegar a Almendra. Simpaticamente e com afabilidade, o Marco informou o ciclista espanhol que não podia fazer aquele percurso sem autorização e guia e que teria de inverter a sua marcha e procurar a partir de Castelo Melhor a sua via de estrada nacional para chegar ao seu destino.
Fiquei com algumas interrogações depois da maravilha da descoberta da criatividade, a outra luz, da representação artística do Paleolítico. Porquê apenas os quatro animais fetiche das gravuras (touro, cavalo, cervídeos e caprídeos)? Porquê tão poucas representações de peixes e de outros animais já que faziam parte tal como os restantes quatro da vida de caça e sobrevivência? Um espaço de culto, por conseguinte, motivos religiosos para justificar aquele conjunto? O que explica a sobreposição de representações em zonas em que ao lado dos painéis interpretáveis existem zonas vazias que poderiam ter acolhido aquelas representações sem sobreposição? Quanto material estará ainda por escavar?
Na parte final da visita guiada, uma nova linha interpretativa se abre: uma cabra montesa tem a cabeça virada algures para o horizonte parecendo comunicar com outro animal do lado de lá do rio, à mesma quota. É uma boa forma de acabar uma visita guiada. Parabéns ao Marco pelo seu profissionalismo e entusiasmo.
Com um almoço agradável no Museu do Coa, a enorme capacidade e simpatia de acolhimento dos Amigos Lurdes e Carlos e a simpatia de sempre dos companheiros de viagem Maria e Vítor, um fim de semana diferente, mas retribuidor da Amizade que vale a pena conservar.
Viva!!! Agradeço o interesse, o artigo é a vossa visita! Bem hajam
ResponderEliminarCaro Marco
ResponderEliminarFoi um prazer tomar contacto com o seu entusiasmo. A figura do agente de desenvolvimento sempre me fascinou. Felicidades para os seus projetos.
AMF