segunda-feira, 25 de abril de 2022

O “PLURALISMO POLARIZADO” DOS RESULTADOS DE ONTEM, EM FRANÇA

 

                                                            (Libération)

(Sim, 25 de abril sempre e nem é necessário retomar o tema do “onde estavas tu no 25 de abril?”. Mas este ano com a especial exigência de repensarmos as condições para a manutenção da liberdade e encontrar um modelo económico e social que simultaneamente a preserve e defenda e garanta perspetivas mais equitativas de repartição dos seus benefícios e proteções. Por isso me pareceu que a reflexão de Xosé Luís Barreiro Rivas, o politólogo galego tantas vezes aqui citado, merece ser aqui destacada, porque é sábia e sobretudo porque nos ajuda a compreender para além do alívio europeu com os resultados de ontem … )

A crónica começa com alguma reflexão sobre a obra de Maurice Duverger, em torno da ideia de partidos e tendências e desemboca nestes dois parágrafos de grande alcance para compreender os desafios que a democracia enfrenta:

A ideia que Panebianco[1] acrescentou, em 1982, à reflexão de Duverger foi a ideia de que a multiplicação de partidos, que se tornam irrelevantes pelo facto de se multiplicarem, conduz sempre a um pluralismo polarizado – ou uma confrontação por blocos, como aqui dizemos – que pressupondo que permanece durante largo tempo, por decisão dos cidadãos como acontece em Espanha, ou por imposição legal da segunda volta, como acontece em França, acabam sempre por gerar um modelo bipolar – defendido aqui por Pedro Sánchez - , em que um dos blocos se torna imprescindível (como Macron) e outro temível (como Le Pen). Uma situação qie com o tempo salva os móveis em manobras arriscadas e espetaculares praticadas à beira do abismo, acelera a destruição inexorável do sistema de partidos.

O combate de ontem em França confrontou o único partido que é relevante – o de Le Pen – com um bloco tão líquido como necessário – o de Macron- cuja temida derrota, se tivesse acontecido, teria posto em perigo a democracia francesa e a União Europeia. E por isso pode dizer-se  que, ainda que haja cinco anos para o resolver, é muito difícil que num único quinquénio se reconstrua um bom sistema de partidos que possa suceder à monocracia de Macron, que terá esgotado dois mandatos. Em certa medida pode dizer-se que a Espanha está – nesse aspeto – um pouco melhor do que a França. Mas a última advertência de Sartori[2]é o que o “pluralismo polarizado” faz crescer os extremismos, que em 2027 poderiam ser Le Pen e Mélenchon. E a França já teme que esteja condenada, mais cedo do que tarde, a colocar a senhora Le Pen no Eliseu.”

Por isso no meu último post de ontem, entendia que as legislativas em França daqui a cerca de mês e meio vão ser o primeiro passo para tentar a reconstituição do sistema de partidos francês, tão abalado por estas presidenciais. E também acho que um quinquénio não será suficiente. O Partido Socialista Francês e a direita francesa, centrista e republicana (que tempos eram aqueles em que gente como Simone Weil pontificava, como o filme de ontem da RTP 2 sobre a lei do aborto em França de 1975 o demonstrou) terão aqui talvez a derradeira oportunidade de fazer prova de vida.



[1] Angelo Panebianco, Universidade de Bolonha: https://core.ac.uk

 

[2] Giovani Sartori, Politólogo italiano

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