Escrevo na imediata sequência da entrevista que António Costa (AC) concedeu à TVI/CNN no seu primeiro dia de primeiro-ministro em gestão. Desconcertante, diria eu, até mesmo algo incomodativa. Porque, e por um lado, AC foi o político inteligente e hábil que quase todos reconhecemos, claramente alguém que é um raro animal político e está, por isso, a milhas de distância, em termos de qualidade e experiência, face a qualquer dos seus possíveis sucessores; mesmo quando desfiou despropositadamente o seu manifesto conhecimento dos dossiês e respetivos números, o seu killer instinct esteve sempre presente e ficou bem ilustrado quando, em claro desafio acrimonioso ao Presidente da República, sugeriu esperar que das próximas eleições resulte uma situação mais estável do que a que temos atualmente (uma verdadeira impossibilidade que duradouramente passará a pairar sobre a cabeça de Marcelo); assim se tornou evidente que AC vai andar por aí, capaz ainda de fazer mossa e/ou de voltar à ribalta.
Mas também porque, e por outro lado, o político que insistiu em se dizer magoado e conformado passou literalmente ao lado de uma autocrítica que os portugueses mereciam pelo péssimo uso que fez da maioria absoluta que teve ao seu dispor. Esta incapacidade de AC para assumir os seus erros (a sua falta de foco na definição de políticas e na gestão governativa como um todo), esta sua continuada e teimosa arrogância, esconde um homem mal com a vida e nitidamente ainda à procura do seu caminho, seja quanto às escolhas de fundo que possa conseguir determinar (Europa como prioridade) ou que lhe venham a ser impostas pelas circunstâncias (Presidência da República) seja quanto ao comportamento que irá adotar durante os próximos meses em que acumulará o ingrato papel de primeiro-ministro em gestão, de ex-secretário-geral do PS e de pretenso influencer de um sucessor em campanha eleitoral (com o seu legado a estar objetivamente em julgamento). Acresce que as explicações sobre os acontecimentos de 7 a 9 de novembro, embora procurando deixar uma imagem de homem de Estado e culpar o Presidente e a Procuradora, também não foram felizes nem completamente convincentes.
No todo, um sabor a fim de festa e um protagonista a desempenhar a custo um papel forçado, com pelo meio uma dose de amargura e disfarçada sede de vingança acompanhada por pitadas de esperança pressentida num incerto regresso de novas razões de otimismo. Como quer que seja, não faltará matéria interessante para observar, sem prejuízo da dominante presença daquela máxima que diz que “o povo é que paga”...
Sem comentários:
Enviar um comentário