quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

PELA MEMÓRIA DE JORGE SEMPRÚN

 


(A Tusquets Editores acaba de editar uma preciosidade. Sob a direção de Mayka Lahoz, “Destino y Memoria – Cien años de Jorge Semprúm” é uma obra de grande significado para comemorar os cem anos de nascimento de uma das minhas personagens de eleição da Europa do século XX. Desde os tempos da clandestinidade do Partido Comunista Espanhol, até à sua experiência de deportado no campo de concentração de Buchenwald, passando pela sua expulsão do PCE na sequência do seu pensamento cada vez mais crítico, pela passagem como Ministro da Cultura de um governo de Felipe González e sobretudo pela sua insigne obra literária, Semprúm é parte integrante de uma memória europeia que se vai esvaindo e que vai dando lugar às mais profundas aberrações políticas. Semprúm é, simultaneamente, uma personalidade e uma memória indissociável da minha visão da Europa progressista e, na sua obra, seja a da memória da clandestinidade, seja a de Buchenwald, seja a da sua projeção futura em torno do modo como ele via a evolução europeia, encontrei dos momentos mais profícuos e retribuidores da leitura.)

Não sei se haverá intelectual, militante e escritor que tenha trabalhado melhor a memória no sentido de matéria de criação artística. Por isso, a minha ideia de Europa é magnificamente representada por toda a travessia pessoal e política de Semprúm, a elegância das suas ideias, a clareza do seu pensamento sobre o que a história nos proporcionou e por isso considero que a força da sua criação literária representa um legado inestimável para que as próximas gerações possam pensar a grandeza do projeto que conduziu à cooperação europeia.

A obra de Mayka Lahoz, de grande apuro estético, traz-nos visões desconcertantes do que foi a vida do personagem Semprúm, na multiplicidade dos seus interesses culturais, na sua errância, no rigor do seu pensamento político, na sua própria memória do holocausto. Creio que Espanha nunca terá tido um ministro da Cultura com tanto peso e espessura, em tempos em que a transição democrática espanhola ainda atraía personalidades incontornáveis do caminho para a liberdade.

Assim, a leitura atenta desta obra equivale a uma comemoração dos cem anos de nascimento de Semprúm que honra o seu legado e que contribui decisivamente para que a sua memória não se apague na já esbatida memória dos fundamentos da construção europeia.

 

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