Como se previa, está à vista o resultado da crise política aberta pela Senhora Procuradora-Geral, devidamente abençoada pelo Senhor Presidente da República e aproveitada por Cavaco e seu adotado pupilo Montenegro para finalmente se conseguir dar de beber à sede de vingança e poder que grassava pelas hostes laranja. No quadro assim criado, Costa deu à sola e passou o testemunho interno a um Pedro Nuno que só queria evitar a hipótese de vencer as eleições a que os portugueses foram chamados, a restante Esquerda persistiu desligada do que verdadeiramente releva, os liberais continuaram a insistir no seu implacável e inaplicável receituário e, por fim, os votantes viram-se reduzidos à derradeira alternativa de permitirem que viesse à superfície a demagogia populista e sem escrúpulos do infrequentável partido Chega.
Exatamente um mês depois da posse do novo governo, a situação que se vive é trágica de todo e qualquer ângulo de observação que possa ser encarada: trapalhadas sucessivas e uma comunicação risível ao comando (fazendo rapidamente lembrar aquele primeiro ano do último governo de Costa), um Parlamento em completa desorientação e que já aprova medidas (do IRS ao fim das portagens) contra a vontade de quem supostamente governa, um espaço público dominado pela grotesca dimensão de divertimento que invade os comentadores (entre excitados pelo protagonismo conquistado e exaltados pela grandeza dos desafios intelectuais de cenarização especulativa que se lhes oferecem), tudo agravado pelo indisfarçável ensandecimento que transparece das atitudes e declarações do inquilino de Belém – se quiserem uma bela síntese do “grau zero da política” que marca este lamentável tempo, sugiro a leitura atenta da crónica de Manuel Carvalho no “Público” de ontem; onde se fala com inegável propriedade de líderes políticos parecidos com feirantes, de cacofonia e festim, de fartar vilanagem e apagamento dos últimos vestígios da razão, de um parlamento a caminhar para uma bolha de irresponsáveis, do sucesso político decidido num jogo de quem dá mais.
O dia de ontem traduziu apenas mais um episódio acrescentado ao estado de manifesto bloqueamento do País para que alegremente nos encaminhamos sem quaisquer sinais de esperança em sentido contrário. Porque nem se percebe o que pretende ao certo Montenegro com a sua “estratégia” de silêncio e “deixem-me trabalhar” nem se percebe o que visa o PS com a sua “estratégia” assente numa dinâmica parlamentar suicida e necessariamente conducente a um novo processo eleitoral, embora se perceba cristalinamente o benefício que de tudo isto poderão retirar as forças extremistas do “quanto pior, melhor”. Além do fim das portagens nas antigas SCUT, estranhamente aprovado pelo PS, pelo Chega e pela restante esquerda parlamentar contra os representantes da Aliança Democrática, assistimos ainda a uma inacreditável exibição de incompetência e irresponsabilidade por parte de um ministro das Finanças a quem já chamaram de “asterisco” e que foi capaz de vir a público revelar, sem baias e despudoradamente, a sua verdade (falsa e assente numa desvirtuação técnica, tudo indica) quanto à situação menos boa das contas públicas nacionais que herdou de Medina – chamando a atenção, naturalmente, dos sacrossantos mercados... Socorro!!!
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