(https://www.ippr.org/files/2017-09/cej-interim-report.pdf)
(Mais do que a
desorientação que reina entre os Conservadores em torno do BREXIT, o que emerge
do presente é o macro-descalabro que a economia britânica vai revelando, em
contexto de autonomia monetária e fiscal, convém sempre recordá-lo; a voz autorizada de Martin Wolf vem
juntar-se ao pensamento já evidenciado por outros quadrantes)
O governo britânico vive
dias difíceis. Theresa May é hoje uma mulher atormentada pelas fissuras que se
vão abrindo entre as hostes conservadoras. Vai parecendo cada vez mais que os
conservadores não tinham unhas para levar a coerência do BREXIT até às suas
últimas consequências. Cameron e Osborne devem ser hoje homens profundamente
arrependidos do topete em inscrever o referendo do BREXIT na sua estratégia
política. Tudo pode acontecer no teatro das negociações com a União Europeia,
não sendo de eliminar a hipótese de nada acontecer, ou seja não haver acordo e
com isso abrir-se um buraco enorme no domínio dos tratados.
Vai emergindo como tema
de investigação a questão de saber o que terá levado os britânicos à
experimentação do abismo. Na verdade, ao contrário do que os BREXITERS
apregoaram, a economia britânica não revelava sinais de força e dinamismo
suficientes para acomodar com segurança e danos menores os riscos do BREXIT
efetivo. E essa é a questão que mais me interessa neste momento desenvolver. O
Reino Unido tem uma das praças financeiras mais relevantes do mundo e
seguramente a referência na Europa, Londres. Sabemos entretanto que essa força
e a especialização de serviços que a acompanha são responsáveis por um país em
plano inclinado. A concentração na região londrina é tal que se imagina que
estará já na fase em que os custos de concentração começam a superar claramente
as externalidades positivas da aglomeração e da atração de recursos e talentos.
Tem autonomia monetária (a tão desejada moeda própria) e por isso não está à
mercê dos constrangimentos do enquadramento do euro. Tem autonomia fiscal. E
dispõe de capacidade de financiamento inquestionada. O que significa que se a
recuperação da economia britânica foi das mais agónicas no contexto europeu
isso deve-se exclusivamente às suas forças/debilidades internas e ao tipo de
gestão macroeconómica decidida pelos conservadores. Com respaldo eleitoral,
diga-se. A vitória de Cameron/Osborne na sequência da qual foi assumido o
compromisso político do referendo do BREXIT foi real, pressupondo por isso que
o eleitorado validou a sua gestão macroeconómica do pós-crise. Podemos espantar-nos
como é que os BREXITERS conseguiram ocultar debilidades estruturais da economia
britânica que estão agora expostas.
Martin Wolf tem um
artigo no Financial Times (FT) (link aqui) particularmente duro sobre esta realidade. Um
crescimento anémico vai sendo projetado no curto prazo e as ameaças de longo
prazo não produzem um cenário mais brilhante. Em 10 anos (2007-2017), o grupo
etário dos 22 aos 39 anos viu o seu rendimento cair de 10%, largamente
influenciada por uma política habitacional desastrosa que fez disparar preços
exorbitantemente. A precarização no mundo do trabalho intensificou-se, com a
figura estranha dos empregados com contratos de zero horas a representar quase
3%. A desigualdade instalou-se e, perante desempenho económico tão pouco
brilhante, os executivos empresariais viram os seus salários aumentados para um
rácio de 150 vezes face ao salário médio dos trabalhadores. A produtividade
estagnou, o investimento também e o pior é que aconteceu o mesmo aos
investimentos em I&D.
Mistério dos mistérios
foi esta economia oculta que foi considerada suficientemente forte para
acomodar os choques do BREXIT. Podemos especular dizendo que tudo isto é fruto
de uma posição de arrogante isolamento, de uma pseudo-superioridade alimentada
pelas memórias de um império. Não compro essa hipótese. Houve quem dissesse que
o rei ia nu, aqui sem qualquer preocupação de lesar sua Majestade, que pelos
vistos tem andado incomodada com a gestão das suas aplicações financeiras, pois
isto de ter de pagar contas ao fim do mês toca a todos. Talvez a Voz dos
economistas esteja desvalorizada e ninguém lhes dê atenção. Até porque outros
economistas esforçaram-se por mostrar que, mesmo com autonomia monetária, o
Reino Unido deveria enveredar pela disciplina orçamental a todo o custo,
ignorando o baixíssimo custo do dinheiro. Em quem acreditar?
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