(Raquel Marín, http://elpais.com)
Eduardo Mendoza é um dos grandes ficcionistas espanhóis contemporâneos. Este autor de obras como “A Cidade dos Prodígios”, “O Ano do Dilúvio”, Uma Comédia Ligeira” ou “A Assombrosa Viagem de Pomponio Flato” é um cidadão de origem e vivência catalã e sentiu-se recentemente impulsionado a publicar um opúsculo sobre a situação político-social da Catalunha que designou por “O que se passa na Catalunha”. O texto, integralmente traduzido para português pela revista “Ler” que ainda está nas bancas, é consistente e tem excertos reveladores de um conhecimento simultaneamente sentido e adquirido.
Escolho três, o primeiro dos quais enquadrador: “Houve ocasiões em que a relação entre a Catalunha e Espanha teria podido seguir por outros caminhos. (...) Não se trata tanto da relação da Catalunha com Espanha ou com o resto de Espanha, consoante considerarmos, mas sim da relação dos interesses da Catalunha com a representação do poder vigente em Espanha num dado momento.”
O segundo é mais especulativo: “Não há dúvida que o independentismo é um movimento real, que calou fundo em amplos setores da população. Enquanto movimento, existe desde tempos imemoriais. (...) Mas antes era coisa de indivíduos isolados. Em geral, pertenciam à classe média ou alta, tinham um grau considerável de educação (...). A sua atitude tinha muito de romântica e um pouco de mística (...). A sua rejeição só se estendia aos espanhóis. (...) Este protótipo foi evoluindo paulatinamente. Uma vez afiançada a transição democrática, isto é, uma vez desaparecidos do horizonte os receios de um possível golpe de Estado, o independentismo entrou numa fase possibilista.”
O terceiro é mais opinativo: “Não há razão prática que justifique o desejo de se independentizar de Espanha. Comparativamente, e apesar de tudo, Espanha não é um mau país. Poderia ser melhor, mas duvido que a Catalunha, entregue às suas forças, se convertesse no paraíso que os partidários da nova república anunciam. Além disso, as unidades nacionais têm hoje pouca margem de manobra (...). Na realidade, os países não existem.” As aberturas à exploração e ao pensamento deixadas por Mendoza são assim inúmeras e nem sempre facilmente consensualizáveis mas, não obstante o seu aviso final (“Quase sempre é tarde quando nos pomos a pensar as coisas”), talvez não seja tempo perdido o que se lhes dedique e qualquer que seja a dimensão que se possa e queira privilegiar.
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