(Quando tiver passado o tempo suficiente, o estudo das incompetências
do Labour para tomar o poder de uns desacreditados conservadores e enredados no
falhanço do BREXIT deverá dar-nos explicações sobre a evidência de que nem sempre chegam os
contextos políticos favoráveis para a alternância democrática)
As desgraças
dos Conservadores têm-se sucedido a um ritmo alucinante. Desde a teimosia de
Cameron em colocar o seu pescoço à mercê de um referendo, à sua política macroeconómica
errada, passando pelas agruras de um BREXIT para o qual ninguém no Reino Unido
estava preparado e pela política tosca e atamancada de Theresa May, os
Conservadores têm feito o possível e o impossível para abrir caminho a uma
alternância democrática. Mas numa espécie de jogo do tipo “a minha incompetência
é maior do que a tua”, o Labour estarrece os mais fleumáticos nas suas próprias
indecisões e incompetências. Curiosamente, quando muito boa gente pensante, à
esquerda e à direita, admitiu que Jeremy Corbyn era o melhor atestado para a não
subida ao poder, a maneira de estar “old
fashioned”e fora do comum de Corbyn atraiu algum eleitorado jovem, cansado da
prosápia trabalhista de reminiscências blairistas (de má memória para toda a
esquerda).
Ora, quando
a “bernarda” do BREXIT não negociado pode rebentar nas mãos de May a todo o
momento e Corbyn parecia ter conseguido manter eleitorado, eis que o líder
trabalhista é apanhado numa denúncia de anti-semitismo. No artigo que Matt Seaton
escreveu para a New York Review of Books (link aqui e aqui), o jornalista faz referência a uma
mensagem de um jornalista americano que lhe foi dirigida e que continha a
pergunta que o bom senso recomendaria que fosse feita: “Será que o Labour perdeu a cabeça?”.
A pergunta
pode ser transformada numa outra: se não perdeu a cabeça, então como é que o
Labour permitiu que o seu líder fosse apanhado numa identificação anti-semita?
O detonador
da crise anti-semita de Corbyn esteve na publicação pelo Daily Mail de
fotografias datadas de 2014 imediatamente antes da sua tomada de posse como líder
trabalhista. Essas fotografias reportam à participação de Corbyn numa cerimónia
de colocação em Tunes de uma coroa de flores homenageando membros do grupo
palestino Setembro Negro responsáveis pelo ataque de 1972 à equipa olímpica de
Israel em Munique.
As cerimónias
de Tunes são algo complexas porque envolveram não apenas a recordação dos
membros do Setembro Negro mas também das vítimas da organização palestina de um
raid israelita realizado às instalações palestina nessa cidade. O problema é
que Corbyn aparece nas duas manifestações de homenagem e das suas declarações públicas
não constou qualquer tentativa de explicação da hoje embaraçosa situação. Corbyn
nunca escondeu publicamente as suas relações com organizações de apoio à Palestina, incluindo as mais combativas e tudo indica que manterá esse posicionamento.
O problema é que globalmente e na sua história o Labour não aparenta revelar
qualquer inclinação anti-semita. Quer isto significar que segundo Seaton, o
envolvimento não rejeitado de Corbyn numa perspetiva anti-semita acaba por desembocar
numa luta política intra Labour, digamos entre as suas costelas social-democrata
e socialista que não é nada favorável acontecer no atual contexto político de
grandes dificuldades dos Conservadores.
Ou seja, por
mais paradoxal que isso possa parecer, a honestidade de Corbyn, que nunca
escondeu a sua proximidade a tudo que é movimento de libertação nacional, arrisca-se
a integrar o vasto rol de pequenos grandes pormenores que têm arredado os
Trabalhistas da alternância democrática. Todos se recordam da diatribe digital
do ministro das Finanças do Labour quando perderam o poder que teve o desplante
de enviar uma mensagem jocosa ao seu sucessor, rapidamente divulgada pela imprensa
inglesa maioritariamente defensora dos Conservadores, que gozava com as
dificuldades que o seu colega iria ter quando abrisse os cofres e verificasse
que o dinheiro era quase nulo.
E a grande
interrogação passa a ser esta: será que o eleitorado integrará positivamente a
honestidade de Corbyn e passará por cima do seu radicalismo, com exceção óbvia
da comunidade judia inglesa? Ou será que os Conservadores resistirão a um
BREXIT com efeitos tornados evidentes e palpáveis?
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