quarta-feira, 29 de agosto de 2018

PARA COMPREENDER A SUÉCIA DE HOJE



(Para uma certa esquerda em que me incluo a Suécia e o modelo escandinavo sempre representaram a possibilidade de combinar inovação e maior igualdade, desenvolvimento e descentralização, tolerância, modernidade, vanguarda de causas sociais. Talvez essa fixação nos tenha impedido de ver a realidade mutável do modelo escandinavo, requerendo uma mais profunda análise crítica dos nossos referenciais.)

Nos meus trabalhos com a colega Pilar González para a Organização Internacional do Trabalho (ILO) tive a felicidade de privar no âmbito dos estudos que realizámos com as experiências de outros países, entre os quais a Suécia. As análises do colega Dominique Anxo alertaram-nos para a resiliência manifestada pelo modelo sueco, mas simultaneamente ajudaram-nos a perceber que o seu modelo também sofreu a erosão das causas sociais, aliás determinada pelo afastamento do poder dos sociais-democratas.

À boleia do Financial Times (link aqui) cruzei-me com um conjunto de gráficos que nos dão conta de mudanças na situação global sueca, sem as quais tenderemos a formar uma perceção presa no tempo das nossas aspirações sobre a sociedade sueca e o seu modelo.

O primeiro gráfico que abre este post traz-nos algo de surpreendente. A desigualdade tem evoluído a um ritmo apreciável na Suécia. Embora o país apresente ainda valores bastante inferiores aos valores padrão na OCDE, a verdade é que a sociedade sueca não escapou à erosão da desigualdade que atravessou nos tempos mais recentes as economias mais maduras. O que aconteceu ao distributivismo sueco das nossas aspirações e referenciais?

A um outro nível, a abertura sueca tolerante traduziu-se na relevante evolução da população imigrada, medida aqui pelo número de autorizações de residência registados no país e pelo número de pedidos de asilo, que tem em 2015 uma queda a pique (gráficos abaixo).




O gráfico seguinte dá-nos conta das dificuldades de integração da população imigrada, o que também não deixa de representar algo de dissonante face aos nossos referenciais. Para além do desemprego de imigrantes ter aumentado, o gráfico abaixo mostra que é sobretudo a variável educação da população imigrada que está na origem das dificuldades de integração.


Além disto, o modelo educativo sueco não faz milagres. O desvio entre os resultados nos testes de PISA obtidos por população nascida na Suécia e nascida no exterior é progressivamente penalizador para esta última.


Os suecos estão próximos de eleições e será provavelmente um primeiro-Ministro de centro-direita a governar o país. A pergunta óbvia é a de saber se o modelo sueco continuará resiliente nos seus valores fundamentais ou se, pelo contrário, experimentará também o recuo civilizacional que anda por aí a pairar.

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