(Dois colapsos, um de proporções bem mais trágicas do que
o outro, trazem de novo à reflexão a questão da saúde das infraestruturas,
relembrando que o seu tempo não passou ao contrário do que muitos nos fizeram
crer. Não sem surpresa, o populismo
reinante aproveita despudoradamente a tragédia dos outros.)
O abatimento do pavimento
do recinto do Porto de Vigo em que decorria um espetáculo musical noturno do
evento do Marisquiño naquela cidade galega anunciou com antecipação a dimensão
de uma tragédia que o poderia ter sido. A baixa altura em que o pavimento se encontrava
face às águas do porto terá limitado a dimensão trágica do acontecimento, a que
acresceu a rápida intervenção de embarcações nas proximidades, limitando-a a um
conjunto elevado de feridos. O empurra-empurra de responsabilidades que se
manifestou após o abatimento entre o empertigado alcalde socialista de Vigo, AbelCaballero,
os responsáveis do Porto de Vigo e a própria Xunta de Galicia que não resistiu
a entrar no bate papo político-punitivo é bem típico do estado a que se chegou
em matéria de infraestruturas em alguns países e regiões europeus. A política de
infraestruturas, sobretudo aquela que se dedica a assegurar aos cidadãos condições
de segurança e proteção, deixou de estar no topo das preocupações dos governos,
substituída pela política das infraestruturas de prestígio, que os “marketers”
adoram.
Uns dias depois, para
tragédia dos italianos que cruzam a cidade de Génova no seu vai-e-vem diário ou
de passagem para outras regiões de Itália, o colapso da ponte-viaduto Morandi
atingiu proporções tais que passará a constituir nos próximos o exemplo mais
tenebroso de incúria ou de desconhecimento da ideia de que uma infraestrutura
também se abate. O populismo feito governo em Itália rapidamente elegeu os seus
inimigos de estimação para sacudir a sua responsabilidade. O 5 Estrelas
focou-se na concessionária da autoestrada, rapidamente identificada como ligada
a um grupo financeiro com sede no Luxemburgo, logo não pagando impostos em Itália
e o discurso musculado da multa de 150 milhões de euros marcou a retaguarda política.
Por sua vez, Salvini da Liga, virou-se para o seu próprio inimigo de estimação,
a União Europeia, e indicou as políticas de austeridade europeias como as
responsáveis pela não libertação de fundos para a manutenção/conservação de
infraestruturas.
Tudo isto sem ainda
estar disponível uma explicação cabal do colapso da Morandi, que tanto pode
decorrer de uma falha de conceção engenharial com efeitos retardados no tempo
ou de manutenção deficiente.
A política europeia é em
parte responsável pela ilusão de que o desenvolvimento económico não necessita
mais de investimento infraestrutural, abordagem bem mais idiota do que apertar
o cerco à fundamentação dos investimentos em infraestruturas. As boas graças do
imaterial e mais recentemente a tentação do digital tornaram antiquadas as
velhas políticas de infraestruturas, com reflexos sérios no risco da sua utilização.
Proibir o financiamento de infraestruturas com o argumento de que os países usaram
e abusaram desse financiamento é idiota, quando o campo da decisão deve pertencer
à fundamentação do investimento.
Tal como referi em post
anterior, estamos perante matéria de decisão que não pode pertencer
exclusivamente ao ministério das Finanças. Os governos necessitam de conselhos
de opinião de especialistas que abalizem a necessidade de novos investimentos e
sobretudo a consistência dos planos de manutenção e conservação. A tempo de
novos colapsos nos surpreenderem.
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