quinta-feira, 9 de agosto de 2018

UMA QUESTÃO DE POSTURA



(Decididamente António Costa não se dá bem com os incêndios. Já não é a primeira nem a segunda vez. O primeiro-Ministro não encontra o tom certo da comunicação e isso começa a revelar traços mais ocultos da sua visão da política e da governação. Não havia necessidade pois a oposição até estava a comportar-se surpreendentemente com sentido de moderação e de Estado.)

Se integrarmos os acontecimentos de junho e outubro de 2017 e agora o aparecimento do primeiro-Ministro no briefing da Autoridade Nacional da Proteção Civil sobre o incêndio da serra de Monchique, é fácil perceber que António Costa não se dá bem com a comunicação sob fogo, ou seja em matéria de incêndios. Talvez sob o efeito de uma injustificada má consciência pelo facto de um grande incêndio o ter apanhado em férias, o seu aparecimento no briefing da ANPC acontece num contexto particularmente calmo em matéria de pronunciamento político da oposição sobre o grande incêndio de Monchique. Até aquele momento, o que tínhamos eram pronunciamentos desencontrados e contraditórios de comentadores, técnicos, especialistas, profissionais, voluntários e especialmente uma comunicação social que teve o seu incêndio de eleição para desenvolver a sua estratégia da dúvida. Nada de novo, pois o país está ainda longe de ter uma posição minimente estruturada e homogénea de como abordar os fogos florestais. Pela sua parte, a oposição estava recatada, não se atrevendo a entrar na liça enquanto os elementos de explicação e resultado não se clarificassem. Por que raio de razão, então, produzir uma comunicação do tipo da que foi produzida, usando a fórmula de que Monchique (a má situação) foi a exceção da regra (a boa situação, ou seja a ausência de incêndios relevantes)?

Entra pelos olhos dentro dos mais sensatos que se justificava uma comunicação mais ponderada e também mais reservada. Em primeiro lugar, ficar-lhe-ia bem ressalvar as vantagens de um verão que demorou a sê-lo, por mais importante que fosse sublinhar o relativo êxito dos alertas às populações para as tarefas de limpeza e até podia citar os números conhecidos das ignições registadas. Segundo, a dimensão da gravidade de Monchique e da perceção dos seus danos alimentada pela tal encantada comunicação social exigiriam mais sensibilidade para a classificar como simples exceção, por respeito pelas pessoas envolvidas e pela repercussão internacional do acontecimento. Terceiro, porque não sabemos o que vem aí no restante verão e todas as cautelas são necessárias porque os desvarios climáticos não cansam de nos surpreender.

A relação entre os políticos e os eleitores, sobretudo a perceção que estes últimos alimentam dos primeiros, é cada vez menos determinada por auréolas, construções de imagem ou marketing político. São as tomadas de posição e as declarações em momentos críticos que, em meu entender, constroem essa perceção. Aconselha-se, por isso, o primeiro-Ministro a pensar bem e muitas vezes no que vai dizer em teatro de operações desta natureza.

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