(Em família, pois a energia já não dá para grandes
aglomerações festivas, lá entrou o 2019, um pouco cansado pelos guinchos permanentes
dos locutores de serviço das televisões cá do burgo, procurando em vão que os
Portugueses sejam um povo alegre, eles lá sabem porquê, que efetivamente não são.
Depois de uma noite bem
dormida, o meu contacto com o novo ano teve por interlocutor o Concerto de Ano
Novo em Viena, com Christian Thielemann a dirigir a Filarmónica.)
Tenho de confessar que, algo estranhamente, o Concerto de Ano Novo em Viena
provoca-me já há muitos anos um fascínio de impossibilidade. Se uma vez que fosse
a lâmpada de Aladino me visitasse, certamente que um pedido de bilhete seria
seguramente a escolha. É de um fascínio da impossibilidade, como hoje em plena
reportagem em direto o locutor de serviço me recordou que os bilhetes chegam
aos 5.000 euros e que há famílias vienenses que seguram ao longo de gerações
uma presença no evento. Este ano, Thielemann fazia a sua estreia no Concerto de
Ano Novo dando para comparar se um bávaro tem pedalada para o fausto vienense,
a princípio um pouco hirto, mas soltando-se à medida que se sucediam as valsas
e as polkas, mais sentimentais ou frenéticas.
É uma forma estranha de começar o ano, fascinado pelo espetáculo de uma das
sociedades mais conservadoras europeias, mas desculpem lá o desabafo, alugaria com
prazer um smoking e um belo laço para gozar uns minutos que fosse a ambiência
daquela atmosfera, este ano repleta de japoneses com aquela pinta e sobriedade
que só um asiático pode revelar. Alguém tem de conceber um Concerto de Ano Novo
para os mais desfavorecidos deste planeta, revolucionando o simbolismo de um
mundo que precisa de combater persistentemente a desigualdade.
2019 emerge assim com as contradições esperadas. A arrepiante tomada de posse
de Bolsonaro, com muitas bandeirinhas e segurança até aos dentes, anuncia
talvez o pior do que os brasileiros poderão enfrentar (nacionalismo até à
exaustão com Deus invocado por tudo e por nada é uma mistura explosiva). Representará
para mal dos nossos pecados uma tendência de 2019 e que habilidade tirará desta
vez Marcelo da sua cartola para construir uma conversa decente de Estado com
este paquiderme?
No plano diametralmente oposto, simbolizando a polarização com que
poderemos contar em 2019, Elizabete Warren marca posição e anuncia-se candidata
para as primárias americanas, preenchendo creio eu o espaço do amplo movimento
que a campanha de Bernie Sanders suscitou e que algumas campanhas à esquerda
nos democratas nas recentes eleições intercalares.
Warren é uma grande mulher e certamente agitará as hostes democratas. The
Two Income Trap – why middle class parents are going broke (com Amelia Warren
Tyagi)(2003) e The Fighting Chance (2014) são duas obras que marcam a fibra da
política democrata americana. Resta-me saber se a sua energia será suficiente
para fazer pontes com os representantes e eleitorado democratas mais jovens e
mais ousados e lá entraremos na velha questão de saber se é mais à esquerda ou
mais ou centro que Trump poderá ser derrotado e ser relegado para o caixote da irrelevância
histórica antes que faça alguma partida. Com falinhas mansas e personagens,
embora de grande valia, mas não suficientemente distanciados da plutocracia financeira,
já sabemos que não dá com o sistema eleitoral americano. A não ser que Trump se
enrede na sua própria vaidade e isso é que seria uma grande conquista de 2019.
Feliz Ano de 2019.
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