quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

UMA BÚSSOLA PARA SÁNCHEZ



(A situação política espanhola está cada vez mais atolada em contradições que as há para todos os gostos, à direita com as vénias demasiado permissivas do PP de Casado e do Ciudadanos à direita extrema do VOX e à esquerda com as sucessivas fugas para a frente do PSOE. O que sugere que alguém inadvertidamente acordou demónios incómodos e que as diferentes Espanhas estão definitivamente em rota de colisão.)

O desafio enfrentado pela liderança de Pedro Sánchez no PSOE era gigantesco. Tudo se resumia em tentar, duma assentada, repor as condições para o diálogo político na Catalunha ao mesmo tempo que no Congresso dos Deputados se conseguia uma precária maioria parlamentar para arredar o PP da governação. O caminho era muito estreito. Por um lado, o espectro de eleições antecipadas por quebra da maioria parlamentar nunca deixaria de pairar sobre o Parlamento. Por outro, nada garantia que o independentismo catalão estivesse de boa-fé.

Todos os maus presságios associados à estreiteza do caminho se confirmaram e até agravaram. Para mais, o viajante PSOE e a sua liderança revelaram-se bem menos preparados para a viagem que a constituição inicial do governo permitia antever. Depois, a má-fé do independentismo catalão veio ao de cima nos mais pequenos pormenores, apesar da relativa contenção que a Esquerra Republicana tem introduzido no processo, logo contrariada pelo persistente oportunismo político de quem lidera hoje a Generalitat.

Entretanto, depois do êxito parlamentar da moção de censura ao governo de Rajoy tudo se precipitou. À direita e ao totalmente ao contrário do que eu havia previsto (e desejado) a luta interna no PP abriu caminho ao ressurgimento da inspiração Aznar, pois Casado não é senão um discípulo reverente do que eu considero ser uma das mais sinistras figuras da política espanhola recente. Esta guinada pró Aznar, creio que em total oposição ao que Rajoy pretenderia, acabou por ter influência no posicionamento do próprio Ciudadanos. Fortemente atingido pela sua deficiente gestão política da ofensiva do PSOE no Parlamento, Rivera nunca recuperou a partir daí aquilo que parecia ser uma perspetiva consistente de modernização da direita espanhola. E, no meio de todas esta trapalhada à direita e espicaçada pela tonta e supremacista clivagem Catalunha versus a outra Espanha, o VOX fez o seu estágio pelas fileiras do PP, ganhou autonomia e surgiu no panorama político espanhol despedaçando a ilusão de vitória do PSOE na Andaluzia. A partir da erupção andaluza, está hoje criada no eleitorado espanhol uma maioria de direita PP + Ciudadanos +Vox que a todo o momento tenderá a produzir efeitos do ponto de vista da governação nacional.

O percurso do PSOE e de Sánchez tem sido tortuoso, casuístico e de sistemático empurrão para a frente dos problemas, dos quais o maior é a criação de condições para a aprovação dos Pressupuestos de 2019. Sem mais argumentos para contornar a constante má-fé dos independentistas na Catalunha, Sánchez recorreu a uma espécie de bazuca descontrolada, geradora de todos os efeitos colaterais possíveis. A territorialização dos Pressupuestos acabou por oferecer à Catalunha praticamente a percentagem de fundos que a aplicação plena do seu estatuto de autonomia lhe poderia garantir. Como é óbvio, quando o lençol é curto, há sempre uma parte do corpo que fica exposto. E neste caso uma dessas peças chama-se Galiza, claramente penalizada na repartição. Não deixando de refletir o estado depressivo em que o PSOE galego se encontra, por conseguinte sem força interna para contrariar o processo, aqui temos o principal efeito da basuca descontrolada. A Espanha das regiões está a ferro e fogo, com a sensação sentida por algumas regiões que a má-fé e a inconstitucionalidade de alguns propósitos dos catalães são recompensadas.

Apesar desta concessão à Catalunha, não há a certeza de que os Pressupuestos sejam aprovadas. O que parece certo é o tempo das eleições antecipadas vai precipitar-se. E o resultado mais provável é o de uma vitória eleitoral do PSOE, mas com a formação de uma maioria de direita que assegurará a governação, provavelmente com mais um caso de governo com participação ou pelo menos apoio parlamentar da direita extrema. Ou seja, uma espécie de réplica da Andaluzia por toda a Espanha. De todo este processo, o principal fator de indeterminação vem das contradições entre a referida maioria de direita. Entretanto, à esquerda, cada vez mais se confirma a inorganiciade do PODEMOS.

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