(O artigo da New Yorker sobre o barão do nacionalismo a nível
europeu traça de forma bastante completa o percurso de ascensão de Viktor Orbán
na sua Hungria menos adormecida do que aparenta. Mas a dimensão mais sugestiva que o artigo anunciava,
a ideia de que as pretensões de Orbán transcendem os muros da Hungria, fica-se
por uma alusão que é mais palpite do que evidência segura)
A leitura dos termos com que a revista New
Yorker anunciava o artigo de Elizabeth Zerofsky e o próprio título, “Viktor Orbán’s far-right vision for Europe”
aguçou-me o apetite para uma leitura, saltando por cima de uma fila interminável
de coisas que aguardam tempo e motivação para serem lidas. O que parecia implícito
no artigo é que o posicionamento de Orbán começaria a apontar para algo mais
ambicioso do que enriquecer e monopolizar o poder, eliminando adversários, ou
seja, visando a afirmação na própria União Europeia. Se excetuarmos alguma evidência
apresentada pela jornalista de que os movimentos nacionalistas e de extrema-direita
na Europa começam a olhar para Orbán como uma liderança inspiradora, deixando
assim figuras como Salvini e Marine LePen para um plano bem mais secundário, a
verdade é que estamos perante meras intuições jornalísticas na antecâmara das
eleições europeias.
Isso não significa que a leitura do artigo seja uma perda de tempo. Um dos
aspetos mais salientes é o uso sistemático da lei, exercida com base na maioria
política que lidera a partir do Fidesz, para depois a contrariar. Ou seja, tropelias
e ataques à democracia praticados no âmbito estrito da lei. Esta é uma característica
relevante destas formas de nacionalismo autoritário. Uma característica que aumenta
a dificuldade de suster tais tendências no plano estritamente democrático: “Nos
sete últimos anos, Orbán usou uma manobra que ele próprio designou de a “dança
do pavão”, O seu governo integra medidas em novas leis precisamente com o
objetivo de as remover”. O artigo descreve meticulosamente a ascensão política
de Orbán até à posição de domínio que o Fidesz hoje exerce perante uma sociedade
húngara que, longe de estar totalmente adormecida, carece dos meios de expressão
e de disseminação de ideias capazes de contrariar a deriva antidemocrática
construída no âmbito da lei.
Orbán faz parte de uma extrema-direita que não pretende abandonar a União Europeia,
ao contrário dos irrefletidos e sonâmbulos BREXITERS. O jogo de Orbán, e isso é
um aspeto a que de tem prestado menos atenção ou uma atenção muito deficiente,
consiste em trabalhar por dentro. Talvez com o propósito de adaptar a União às
suas pretensões nacionalistas e sobretudo livrar-se do fardo das migrações e
dos refugiados. O primeiro-ministro húngaro faz gala das suas origens humildes
e contam-se afirmações simbólicas como aquela que refere que só usou um quarto
de banho interior depois dos quinze anos.
Ainda que o artigo pouco ou nada diga sobre as tais pretensões europeias de
Orbán, pelo menos a partir da sua leitura fica-se consciente que o futuro jogo
democrático na União terá de contar com lideranças como a de Orbán, sempre
preparado para esticar a corda dos limites democráticos entre muros. Claro que
tudo será mais ou menos evidente consoante a força que estes movimentos
revelarem nas próximas eleições europeias e a magnitude da sua representação parlamentar.
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