domingo, 15 de maio de 2022

BENEFICIÁRIOS LÍQUIDOS?

Interrogo-me, inquieto, sobre o que pode levar uma personalidade com responsabilidades públicas máximas, como o Presidente da República, a produzir declarações do tipo das acima citadas a partir de uma notícia do “Diário de Notícias”. Foi ontem, em Cascais, na Sessão de Abertura da Conferência “Portugal XXI: País de futuro” que Marcelo Rebelo de Sousa disse aquela enormidade político-económica, densificando-a ainda com alguns acrescentos nada adequados e manifestamente pouco corretos como os seguintes: (i) que “tal como aconteceu, embora de forma muito diferente na Segunda Guerra Mundial”, “somos de momento beneficiários líquidos da situação vivida a nível internacional” (algo que é essencialmente falso qualquer que seja o prisma por que se observe a questão, além de algo indizível nos termos em concreto utilizados); (ii) que isso acontece porque “Portugal está solidário na guerra, mas é visto como longínquo da guerra, é visto como longínquo da guerra para o turismo, é visto como longínquo da guerra para o investimento” (algo no mínimo duvidoso senão ultra-circunstancialmente); (iii) que “mesmo descontando a inflação” (!), essa “é a realidade que é”, ainda que considerando a sua dimensão conjuntural, seja “porque o investimento é largamente imobiliário” ou porque “deriva de haver economias ou sociedades que estão instáveis e, na dúvida, as pessoas procuram o lugar seguro” (algo baralhativo pelo volume de confusões temporais e estruturais chamadas à colação sem qualquer critério de rigor analítico); (iv) que “o inteligente é saber aproveitar a ocasião porque é em parte irreversível, em parte pode não se repetir com a mesma frequência” (algo completamente deslocado face ao que seria verdadeiramente “inteligente” que se fizesse na atual conjuntura nacional); (v) que “o que era a loucura do investimento para a Europa do Leste num determinado momento, agora passa a ser um modismo ou pode ser um modismo para Portugal” (algo completamente disparatado, como infelizmente comprovaremos no próximo futuro).


Ou seja, e para concluir: claro que todos compreendemos, incluindo com forte dose de condescendência cidadã, que a maioria absoluta de Costa fez com que tudo resultasse furado em relação às expectativas do Presidente sobre o seu segundo mandato; só que tal não é de molde a justificar o grau de perturbação que Marcelo vai evidenciando sem tréguas nos seus permanentes e cada vez menos pertinentes comentários a propósito de tudo quanto vai sucedendo por cá e no mundo ― daí que a minha humilde e bem-intencionada sugestão vá no sentido de solicitar ao Presidente que privilegie a retoma do seu anunciado controlo da “bazuca”, tão descontrolada e desregulada ela vai indo no quadro de um processo que começa a ter tudo para acabar menos bem (por desperdício de oportunidade) ou até mesmo mal (por encaminhamento desviante)...


(Henrique Monteiro, http://henricartoon.blogs.sapo.pt)

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