quinta-feira, 26 de outubro de 2023

AO LADO DE ANTÓNIO GUTERRES

 


(Já tínhamos percebido que o segundo mandato do Secretário-Geral da ONU não ia ser um mar de rosas perfumadas. A deterioração do ambiente internacional, primeiro com a brutal invasão russa da Ucrânia e agora com o ataque não menos brutal do Hamas a Israel e posterior ataque das forças israelitas ao território de Gaza e não esqueçamos o agudizar da violência no West Bank, iria colocar o frágil equilíbrio das Nações Unidas sob fogo variado. A posição de António Guterres sobre o extremar da violência e pedido de cessar-fogo talvez tenha surpreendido os mais sonsos e distraídos, mas tenho para mim que um Homem de consciência profundamente católica como o Secretário-Geral teria obviamente de colocar os pontos nos is e, sem deixar de denunciar com vigor a atrocidade inicial do Hamas, não poderia deixar de defender a Carta das Nações Unidas e condenar os propósitos de vingança de Israel, sobretudo do ponto de vista da mortandade a que os Palestinianos estão a ser sujeitos e não ignoremos a opressão cada vez mais noticiada na Cijordânia. Que o descontrolado Ministro dos Negócios Estrangeiros tenha lido de viés e enganosamente o discurso de Guterres e solicitado a demissão do Secretário-Geral acusando-o de branquear a atrocidade do Hamas não me admira de todo, pois ilustra bem a arrogância de uma réplica que vai muito além da prática do direito de defesa. Hoje em dia, é cada vez mais difícil separar a justa defesa do direito de Israel à defesa do exercício tresloucado de poder que a extrema-direita tem exercido e que transforma a relação com o Hamas numa tempestade perfeita de violência sem par e de riscos de generalização do conflito fora dos limites de um conflito local entre um país e um grupo terrorista. A pergunta incómoda e inevitável é a de saber quantos Palestinianos têm de morrer para se esgotar o direito de defesa de Israel.

Alexandre Lucas Coelho tem hoje no Público um artigo corajoso em linha com a coragem de António Guterres, mostrando com clarividência que alguém tem de pronunciar as palavras certas e colocar Israel na justa proporção da sua ira e direito de defesa. Não é de afastar que a coragem de Guterres o tenha colocado na boca do lobo e que a sua ação como Secretário-Geral vá ser perturbada pelo contágio da histeria do Ministro dos Negócios Estrangeiros israelita. Mas o direito à defesa de Israel face ao desespero do Hamas não pode equivaler a ignorar anos e anos de opressão Palestiniana e a precipitação do seu extermínio como povo como dano colateral da perseguição ao Hamas.

As palavras de gente como Alexandra Lucas Coelho ou Clara Ferreira Alves que conhecem o terreno, que têm capacidade de diálogo e interação com ambas as partes, mas que conhecem de perto as condições de opressão a que o povo Palestiniano é submetido valem mais do que quaisquer outras e a elas me atenho nestes momentos de procura de lucidez.

E já agora enquanto redigia este post, chegou-me a casa via Amazon um livro recente (2023) que me despertara a atenção em crónica do New York Times – A DAY IN THE LIFE OF ABED SALAMA – de Nathan Thrall, publicado pela Penguin – Allen Lane que me é apresentado como uma obra prima de compreensão da tragédia da Palestina, no fundo uma história da vida de Palestinianos em busca pela sobrevivência sob as regras israelitas.

A leitura certa no momento certo.

Nota final

Nesta zona central de Vila Nova de Gaia, estou há mais de cinco horas sem internet, porque segundo a informação que obtive a NOS está a realizar uma operação de manutenção com algum significado. Sem qualquer aviso prévio para os utentes e assinantes.

Ou muito me engano ou ainda nos vamos dar mal com este oligopólio das telecomunicações.

 

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