segunda-feira, 2 de outubro de 2023

UNS EVOLUEM, OUTROS FICAM PARADOS

 


(A imagem que abre este post mostra-nos um TGV algures no mundo, prestes a iniciar uma viagem. Poderíamos pensar que se trata de alguma estação na China, país com a rede mais desenvolvida no mundo de comboio de alta velocidade, ou então na Espanha aqui ao lado, nada mais nada menos do que a segunda rede mais importante do mundo. Sim, a Espanha, talvez para nosso espanto e para escárnio da nossa incapacidade de decidir, tem a segunda rede mais importante no mundo e nós aqui ao lado continuamos a não usufruir dessa contiguidade virtuosa. Mas não. A imagem não respeita a redes já instaladas, mas antes a primeira linha numa economia emergente de que iremos falar abundantemente no futuro dada a sua trajetória imparável. É da Indonésia que se trata, que acaba de inaugurar a sua primeira linha, entre Jacarta e Bandung, ver mapa abaixo. A falência da modernização infraestrutural em países como os EUA e o Reino Unido, por exemplo, é uma coisa que dá que pensar, sobretudo se pensarmos que por detrás dessa enorme falência e atraso estão motivos como nos EUA a resistência ao investimento público e no caso do Reino Unido a mais completa falência das políticas liberais, que têm deixado o Reino Unido infraestruturalmente mais pobre, como aliás tem sido visível na sua vulnerabilidade à severidade climática. Mas o Canadá e a Austrália estão na mesma situação de desvantagem, sugerindo que seguindo a ilusão da sua superioridade no imaterial terão desguarnecido a melhoria infraestrutural encontrando-se hoje, por isso, em maus lençóis.)

 


Sob influência da China, a iniciativa da Indonésia mostra que os países emergentes estão a compreender a relevância do transporte ferroviário de alta velocidade para políticas de mobilidade ajustadas não só à sustentabilidade, mas sobretudo às grandes distâncias a percorrer em alguns países.

O caso espanhol deveria ser considerado um verdadeiro caso de estudo, pois devagar e devagarinho, sem grandes alaridos e sobretudo sem a nossa capacidade de nos mortificarmos com decisões adiadas, a verdade é que Espanha tem a funcionar a segunda rede ferroviária de alta velocidade no mundo, num modelo que reforça e consolida consideravelmente a grande dimensão e potencial do seu mercado interno (também potenciada pela sua diversidade regional). A interligação com França não tardará muito e, nesse contexto, a marginalização a que Portugal se entrega é brutal, até porque a ideia de nos ligarmos à ligação Corunha (Santiago), Vigo. Ourense e Madrid continua a aguardar a primeira pedra, não sendo possível perceber se a promessa de começar pela ligação Braga-Vigo vai ou não ser cumprida. Os defensores da ligação Lisboa-Madrid não estão a dormir e seguramente que estarão a trabalhar na sombra, enquanto a norte se brinca às casinhas e aos jogos florais da política.

Mas este tema da modernização infraestrutural falhada em algumas economias avançadas constitui em si um tema interessante de reflexão. O risco, evidente sobretudo em países como Portugal em que se terá exagerado na magnitude do investimento em infraestruturas na fase inicial de modernização aberta pelos Fundos Europeus, de abrir caminho a uma visão etapista de infraestruturas primeiro e imaterial depois, tem mais riscos em meu entender do que o excesso inicial. O facto da política de manutenção e conservação não ter sido assumida em proporção ao investimento feito vai pagar-se caro, como aliás é já visível em matéria de TGV olhando para a vizinha Espanha. Portugal não está a capitalizar a contiguidade a uma rede poderosa, beneficiando de um mercado ibérico alargado com elevada mobilidade.

Quanto ao Reino Unido, a sub-modernização infraestrutural é um claro indicador da falência conservadora e das consequências da sua viragem anti-investimento público que Cameron-Osborne deixaram aos britânicos e da qual dificilmente poderão recuperar a curto prazo.

Porque será que os liberais portugueses não tugem nem mugem quanto a estas matérias, quando afinal a viragem política observada no Reino Unido é a que mais se aproxima das suas convicções?

 

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