sábado, 7 de outubro de 2023

UE A 36 TALVEZ, MAS PARA QUÊ DESCARATERIZÁ-LA?

(Quitatintahttp://elpais.com)

Tenho aqui expressado com alguma frequência as minhas sinceras angústias em torno desse facto que vai estando em preparação num sentido quase irreversível por parte das potências liderantes e das principais instituições europeias que é o do alargamento da União. As razões são conhecidas e estendem-se entre dois extremos: o da dimensão de sobrevivência física que a guerra tende a tornar real e profundamente inibidora e o da dimensão de sobrevivência político-económica que a hipótese de uma adesão de nove países pobres e democraticamente débeis necessariamente determinaria. O cu-de-boi ganha um peso acrescidamente limitador quando se vão conhecendo as crescentes posições nacionalistas e anticomunitárias que pululam e minam a desejável coesão dos “Vinte e Sete” (da Polónia e Hungria às ameaças da Eslováquia, por um lado, ou das diversas manifestações de “frugalidade” às recusas de avanços na integração orçamental e monetária, por outro). Tudo num quadro em que as saudades de lideranças passadas ganham quotidianamente sentido perante a falta de comparência ou a performance desgovernada das atuais (basta ouvir o insuportável Charles Michel ou o inconvincente voluntarismo de Ursula, como também perceber a incipiência efetiva de Scholz ou a apenas adornada conversa de Macron). Ou seja: a coisa está preta, muito preta mesmo, seja no plano dos trabalhos de casa internos cuja realização se impõe ou no dos problemas externos cuja internalização exige mediações complexas!



(Nicolas Vadot, http://www.levif.be)

Mas o meu ponto de hoje é algo mais concreto ao decorrer da minha constatação e visualização dos principais registos da Cimeira de Granada, ontem realizada. É que, num momento em que o debate recrudesce com pinças em torno do que se poderá e deverá fazer na matéria e sobre ela ― nomeadamente com o eixo franco-alemão a procurar estruturar caminhos e controlar os maiores danos potenciais (veja-se o relatório “Sailing on High Seas” que recentemente foi produzido por um grupo de especialistas de alto nível nomeados pelos dois governos) e a Comissão a anunciar para dentro de um mês um relatório sobre a readiness dos candidatos para aceder ao bloco ― e num momento em que se conhecem as indefinições e contradições associadas à conjuntura da guerra ucraniana (e às dificuldades manifestas ligadas à sua adesão europeia, tendo sido esta semana divulgado um relatório interno à UE assente em estimativas internas do orçamento comum e segundo o qual a adesão da Ucrânia daria a Kiev o direito a cerca de 186 mil milhões de euros ao longo de sete anos e transformaria vários Estados-membros em inéditos contribuintes líquidos) e também num momento em que se percebeu com nitidez que o tempo ainda não era o das grandes decisões, nem sequer o das marcações de terreno, foi com espanto e um certo embaraço que tomei consciência da prestação do nosso representante nacional e aspirante europeu.

 

Com efeito, e quando Ursula, Michel e Sánchez faziam, como institucionalmente lhes cabia fazer, as despesas mediáticas de um encontro basicamente metodológico em que nem a “data mágica” do inefável Michel foi tolerada, António Costa veio publicamente explicar que no decurso da reunião tinha sido próprio a tirar um coelho da cartola, propondo (pasme-se!) a consideração pelos seus pares da hipótese de se avançar por via de um “grande edifício multifuncional” (“como se fosse um centro comercial, com uma área comum”) e, como não podia deixar de ser, com o complemento de uma espécie de “PRR permanente”. Simplesmente inoportuno e inapropriado, por uma banda, e grosseiramente aproveitador sob o guarda-chuva de uma lógica historicamente desligada, por outra banda! A evolução dos acontecimentos desvendará seguramente o racional deste comportamento.



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