sábado, 14 de outubro de 2023

QUANDO O HORROR GERA MAIS HORROR

 

                                                            (Foreign Affairs)

(Escrevo sem ter ainda uma informação completa sobre a mais que provável operação militar israelita de invasão da faixa de Gaza e ainda suspenso do inqualificável ultimato de deslocamento do norte para o sul dessa mesma faixa de um milhão e duzentos mil palestinos. O que sei é que o horror também inqualificável do terrorismo do Hamas que se abateu sobre Israel irá dar origem à consumação do que estará perto de uma aberta limpeza étnica, sinal de que funcionou a velha regra do confronto entre os extremos do radicalismo, o do Hamas e o da extrema-direita israelita no poder. Afinal, ambas as forças convergem na ideia de que o conjunto do território Gaza+Israel+Cijordânia só poderá ser ocupado por judeus (o que implicaria o extermínio e êxodo palestino) ou por palestinos (que pressuporia a aniquilação total ou êxodo completo dos judeus). Quer isto significar que o horror em toda a plenitude das suas possíveis manifestações encontrou no momento político atual as condições ótimas de detonação – a chegada da extrema-direita israelita ao poder e o predomínio do Hamas na defesa dos interesses da Palestina, com uma Fatah marginalizada e remetida para os meandros da sua corrupção. Entretanto e para coerência do que têm sido os últimos tempos, a União Europeia reforça a todos os níveis a sua irrelevância, com a Presidente da Comissão Europeia a manifestar de novo a sua total incapacidade de ver os problemas globais e não apenas a primeira jogada por mais mortífera e horrenda que surja aos nossos olhos. A Europa caminha seguramente para a sua total irrelevância.)

 

Sucedem-se entretanto os testemunhos de gente que vê na mais que provável invasão de Gaza por parte das forças israelitas um erro estratégico, sendo de lamentar que a ideia de erro estratégico para os próprios israelitas se sobreponha à condenação da regra “o horror tem de dar origem a mais horror”. A invasão não é apenas indesejável do ponto de vista estratégico. É-o também do ponto de vista moral e humanitário, argumentos e dimensões que bastariam para dissuadir Israel (e só os EUA o poderão fazer) de mergulhar nesse buraco escuro. A probabilidade dos Palestinos que abandonarem agora o território mercê da ameaça israelita nunca mais poderem regressar à sua Terra é quase segura e a matança generalizada que irá observar-se vai multiplicar sabe-se por quanto os desmandos horrendos do Hamas em território de Israel, atingindo populações que muito provavelmente não se reconhecerão na influência do Hamas.

Do ponto de vista estratégico, a elevada probabilidade da invasão de Gaza gerar novas ondas de violência na chamada West Bank e em Jerusalém, escalando a guerra permanente a níveis extremos, o que também parece não ser do interesse dos próprios EUA, confirma esse erro e enterra de vez a discutível ideia israelita de que poderia organizar a sua segurança ignorando a situação dos Palestinos e sujeitando-os a uma servidão de acantonamento num pequeno território.

Tal como o referi em post anterior, a tese dos dois Estados foi enterrada para dar origem à ascensão da ideia de um estado único, acompanhamento de limpeza étnica dos palestinos. A reencenação da barbárie para todos os gostos está em marcha, ao mesmo tempo que vai à cena a gasta perceção da irrelevância da Europa.

 

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