(Aquilo que parece ser uma jogada de antecipação de Juan
Guaidó, tentando precipitar os acontecimentos apelando a uma sublevação global
das Forças Armadas e a uma marcha libertadora da população, está por demonstrar
em que condições de informação e negociação ocorreu. À medida que os acontecimentos se precipitam,
cada vez mais me parece um voto pio o apelo ao diálogo e a esperança numa solução
político-pacífica para a Venezuela. Bem gostaria de estar enganado.)
Não se imagina que Guaidó tenha partido para uma solução de afrontamento
simbólico ao regime de Maduro, indultando e libertando o principal líder da
oposição em prisão domiciliária, sem informação e negociações prévias que
justificassem a precipitação dos acontecimentos. Guaidó não parece ser um líder
irrefletido, tem medido bem os passos que dá e se avançou temerariamente isso
poderia representar um afunilamento preocupante de posições. Imagina-se também que
complexas e obscuras negociações de política internacional estarão a ocorrer,
num xadrez que inclui também a cada vez mais isolada Cuba. Não são ainda claras
as posições de países como a Rússia e a China, não necessariamente com posições
convergentes e muito provavelmente é nessa base que Nicolás Maduro vai
encontrando algum apoio tático, já que neste momento tudo leva a crer que Maduro
tem o poder por um fio. DE qualquer modo, pareceu-me um pouco patética e preocupante
pelo vazio que comporta a posição de espera de Guaidó, aguardando pelo engrossar
das multidões e pela chegada de mais militares desavindos com Maduro.
Mas isso não significa que os corpos pretorianos de apoio ao cada vez mais
isolado líder chavista da Venezuela, que são sempre os que têm mais a perder em
processos abruptos de destituição, não se estejam a preparar para um
afrontamento sanguinolento e fortemente repressivo. Aliás, os apelos da
diplomacia ao diálogo e à negociação política tendem a transformar-se, à medida
que a situação se deteriora, no mais puro “wishful
thinking”, pio e bondoso, mas inconsequente. Na verdade, os jogos de tensão
que se desenvolvem regra geral neste tipo de situações quebram normalmente
pelos menos resistentes à guerra de nervos e quando alguém quebra a precipitação
da violência e da guerra civil tornam-se inevitáveis, quedando as esperanças
limitadas a um enfrentamento tão curto no tempo quanto o possível.
A não ser se for forçado pelos interesses políticos maiores que se movimentam
na zona, esperar que Maduro ceda aos apelos do diálogo e da negociação política
é uma pura declaração de intenções. Forçar Maduro a partir de dentro com
manifestações massivas de massas parece-me muito arriscado e forçar a partir de
fora pode ser rapidamente lido como uma não recomendável ingerência externa. Por
isso, à medida que a situação se vai tornando mais tensa a probabilidade do
confronto entre militares e milícias de Maduro e o apoio popular a Guaidó vai-se
intensificando até ao inevitável.
Num contexto desta natureza, a candura de Catarina Martins sobre o regime
de Maduro soa a canto de beata. Já o discurso do PCP soa a velho sabidola que não
abdica casmurramente de marcar a sua posição mesmo que a casa esteja a cair de
pobre e prestes a desabar.
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