sexta-feira, 26 de abril de 2019

UMA ENTREVISTA DE FERRO


A entrevista de Eduardo Ferro Rodrigues (EFR) ao “Público” de ontem constitui uma manifestação inequívoca de inteligência e combatividade política. Na reta final de uma carreira que foi brutalmente interrompida em vários momentos cruciais – com destaque para aquela lamentável Sexta-Feira (9 de julho de 2004) em que o Presidente Jorge Sampaio comunicou ao País que iria dar posse a Santana Lopes na sequência da demissão de Durão Barroso (a caminho da liderança da Comissão Europeia) e não convocar umas expectáveis eleições antecipadas (EFR era secretário-geral do PS, perdera as Legislativas de dois anos antes por pouco mais de 2% de diferença em relação ao PSD e acabara de vencer as Europeias do mês anterior com 45% de votos, assim aspirando legitimamente a uma vitória que lhe daria o lugar de primeiro-ministro), ao que se seguiriam os traumáticos desenvolvimentos de todo aquele doloroso processo Casa Pia acrescidos de insultuosos rumores de envolvimentos que ficaram por esclarecer publicamente –, EFR chegou contra o hábito estabelecido e com uma cristalina simplicidade e abrangência a segunda figura do Estado Português (o próprio refere com graça que Cavaco fez, na véspera da sua eleição, um discurso muito duro contra uma tal solução e que terá mobilizado muita gente a votar “neste vosso amigo” e levado a que tenha ficado com “essa dívida de gratidão ao antigo Presidente da República”) e vem desempenhando com inequívoca segurança a correspondente função. Estará proximamente em causa a sua permanência ou o seu afastamento com vista à legislatura que aí virá, sendo hoje claro a olhos vistos que a primeira hipótese favoreceria melhor o interesse nacional do que qualquer outra escolha, sempre largamente (in)decifrável, que pudesse passar pela cabeça de António Costa e da direção do PS. Pois também para esta perceção contribui uma entrevista que prima pela lucidez do balanço que acaba por permitir e das leituras adjacentes que o acompanham a talhe de foice – ou seja: por estas como por outras mais, um EFR em tão apurada forma estratégica e tática iria certamente fazer falta.

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