(A robotização faz parte das interrogações do capitalismo de hoje. Por um
lado, retoma a velha e histórica questão das ameaças sobre o emprego. Por
outro, acentua a perplexidade dos efeitos tardios sobre a produtividade. Os valores da densidade de robotização das
economias trazem informação relevante e suscitam a dúvida sobre o lugar que
Portugal ocupa nesta matéria.)
O avanço da robotização veio reavivar velhas questões na economia, mas veio
também suscitar novas interrogações. As velhas questões são conhecidas e
respeitam aos riscos de destruição de empregos. Cada vaga de progresso tecnológico
produz recorrentemente esta questão. Não é fácil encontrar uma posição consensual
sobre estes efeitos. Tal como se tem verificado em todas as ondas de progresso tecnológico,
existem amargas diferenças de perspetiva entre quem sofre as consequências da
substituição do posto de trabalho e quem beneficia da criação de novas oportunidades
de criação de emprego. Esta é a fonte da divergência de perspetivas. O chamado “skill-bias”, ou seja, a tendência para
que as sucessivas ondas de progresso tecnológico valorizem as competências de maior
qualificação, desvalorizando as baixas qualificações, é pelo contrário um fator
de consenso, mas a sua tradução em termos de matéria de opinião pública é débil.
Todas estas dimensões do problema são recorrentes e por mais que muito boa
gente insista no conhecido “agora vai ser diferente”, muito boa gente afirmou
isso no passado e não foi. Mas o sortilégio da inovação é a sua indeterminação.
Por isso, nada de novo.
A nova questão tem mais que se lhe diga, embora pelo menos na onda tecnológica
das tecnologias de informação e computação ela também tenha surgido. Existe hoje
uma desproporção evidente entre a magnitude de avanço tecnológico que a
robotização representa e os efeitos sobre o crescimento económico e sobre a
produtividade. Os americanos são os que têm discutido a questão com maior
profundidade, mas os dados da figura que abre este post esclarecem que os EUA estão longe de ser a economia mais
robotizada. Mas a desconformidade existe e o mundo das economias avançadas atravessa
hoje um período algo enigmático de desaceleração do crescimento da
produtividade, que dá alento inclusivamente aos keynesianos que vêm nesse problema
os efeitos negligenciados pelo mainstream
da estagnação de procura que por aí se faz sentir. Neste caso, a interrogação é
de outra natureza. É de facto indeterminado o período de tempo que medeia entre
as emergências tecnológicas disruptivas e a observação de efeitos sobre a
produtividade. A interrogação está de novo aí, em todo o seu esplendor. Mas há
quem vá mais longe e arrisque dizer que o progresso tecnológico “já não é o que
era”. Esta expressão e o “agora é que vai ser diferente” são expressões de
grande risco e refletem alguma ignorância sobre a irredutível indeterminação da
inovação. Não vale a pena ignorar essa dimensão, essa sim, é a grande certeza
do tempo longo.
Observando os dados da densidade de robotização para 2017, para além da evidência
de que a economia americana está aquém do esperado, eles seguem uma certa
regularidade. No topo estão os conhecidos do costume. Duas notas apenas sobre
isto. Primeiro, a Coreia do Sul evidencia de novo a sua regularidade histórica.
Sem hesitações, o país assume sempre a última tecnologia disponível, absorvendo-a
plenamente, para depois em torno da mesma desenhar e concretizar uma trajetória
tecnológica virtuosa e geradora de inovação entre portas. Aí está no topo da
densidade de robotização e seguramente que se sairá de novo a contento dessa
opção. Segundo, os países escandinavos mostram também com firmeza que o seu
modelo mais redistributivo e inclusivo não contende com as opções do apuro
tecnológico, reafirmando o princípio de que a inovação não é incompatível com a
dimensão social do desenvolvimento. Terceiro, a força industrial da Alemanha persiste. Onde estaremos nesta hierarquia: acima ou abaixo da Espanha?
E aqui temos o sumo da inovação. Irredutivelmente indeterminada não podemos
antecipar os seus efeitos e contornos. Mas os mesmos observados os campos possíveis
da sua interpretação iluminam-nos o futuro, mesmo que indeterminado. Uma boa
alegoria dos tempos modernos.
(Nota final: desculpas pela reduzida atividade bloguista. Mas o ambiente hospitalar,
mesmo privado, não é lá muito estimulante para a reflexão)
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