quinta-feira, 11 de junho de 2020

UM CERTO RECOMEÇO


Porque a mudança foi relevante e dela resultarão necessariamente consequências, valerá a pena guardar a memória das capas dos jornais nacionais no day after (falta o Negócios porque foi dia feriado). Há de tudo como na farmácia: os que deixam uma nota crítica em relação ao abandono de Centeno, os que valorizam o seu trabalho, os que não se esquecem de introduzir Leão no elenco, os que ressaltam a incerteza que temos pela frente, os que já apontam ao “buraco” de “contas nunca dantes navegadas”.

Neste último domínio, e já que estou com a mão na massa, quero referir que o comentário feito a propósito por José Gomes Ferreira na “SIC Notícias” foi desta vez relativamente eficaz – sobretudo sendo proveniente de um jornalista nem sempre tão objetivo quanto lhe deveria deontologicamente caber – ao explicitar que o orçamento suplementar de 2020, além de prever a injeção de 5 mil milhões de euros para efeitos de estabilização da economia e da sociedade, vai ter de prever significativos aumentos de despesa – quer os já comprometidos para fazer face imediata ao coronavírus quer os associados aos chamados estabilizadores indiretos automáticos do Estado (prestações sociais e similares) – e de compensar a insuficiência de receita que se irá manifestar nos cofres do Estado, tudo estimado num valor a rondar os 14 mil milhões de euros (com o consequente agravamento da dívida pública para níveis preocupantes e, avisa, suscetíveis de nos colocar em maus lençóis perante os mercados, não obstante o BCE). Deixo para outras núpcias a parte restante do comentário, na qual o jornalista desenvolve uma aritmética básica, extemporânea e algo viciada (50 mil milhões do Plano de Recuperação Europeu em sete anos, logo 7 mil milhões por ano, logo apenas metade do desacerto relativo a 2020) para sustentar a hipótese de que “estaremos a entrar no mesmo erro que levou a uma brutal crise em 2011-2012”. Até pode ser que estejamos no caminho dessa tal “brutal crise”, ou até de uma pior, mas a sua deteção carecerá certamente de outras exigências analíticas e os seus impactos apresentarão certamente contornos bem mais complexos, já sem falar das condições necessárias ao seu afrontamento – com muito sentido estratégico e poucas daquelas mezinhas de se atirar pura e simplesmente dinheiro para cima dos problemas, se possível. Tudo assuntos que estarão na ordem do dia nos tempos difíceis que se avizinham.

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